STF manda recado à ABIN: "Arapongagem é crime. Praticado pelo Estado, é ilícito gravíssimo"
Carolina
Brígido, para O Globo
BRASÍLIA — Ministros do Supremo
Tribunal Federal (STF) usaram a análise de um processo sobre a atuação da
Agência Brasileira de Inteligência (Abin) para deixar claro os limites de
atuação para este tipo de atividade. A ministra Cármen Lúcia foi uma das mais
veementes:
— Inteligência é atividade sensível do Estado, mas está posta na
legislação como sendo necessária. Arapongagem é crime. Praticado pelo Estado, é
ilícito gravíssimo. O agente que obtém dados sobre quem quer que seja fora da
legalidade comete crime. Não é de crime que estamos falando, é de uma norma que
estabelece o comportamento que tem de respeitar limites — disse Cármen Lúcia,
completando: — O fornecimento de informações é ato legitimo, quando prestado
conforme a lei. O que é proibido é que se torne subterfúgio para o atendimento
de interesses particulares
Abin: GSI afirma que decreto promoveu
'alterações administrativas' na agência
Por nove votos a um, o Supremo Tribunal
Federal (STF) declarou constitucional a norma que autoriza a Agência Brasileira
de Inteligência (Abin) solicitar a outros órgãos informações sigilosas
relacionadas à defesa nacional. Os ministros ponderaram, no entanto, que esses
pedidos devem ser acompanhados de fundamentação, para que se evite o uso dos dados para objetivos particulares.
Também foi decidido que a Abin só pode ter acesso a informações pessoais de
cidadãos protegidas pelo sigilo mediante autorização judicial. É o caso de
dados bancários, fiscais e telefônicos.
Relembre:Abin recebeu 1.272 relatórios de
inteligência para repassar informações a Bolsonaro
Os votos foram dados no julgamento de uma ação que a Rede Sustentabilidade
e o PSB apresentaram contra a Lei 9.883, de 1999, que autoriza o
compartilhamento de dados entre os órgãos de inteligências — entre eles, a
Unidade de Inteligência Financeira (UIF), antigo Coaf. Segundo os partidos, a
Abin, como coordenadora do sistema de inteligência, teria o poder de requisitar
informações sigilosas a outros órgãos. Em seus votos, os ministros esclareceram
que não existe esse poder de requisição, apenas de solicitação. O
compartilhamento de informações não seria, portanto, obrigatório. Apenas Celso
de Mello estava ausente.
Nova estratégia: Com verba 68% maior, Bolsonaro amplia gastos
e inteligência vira prioridade do governo
Na ação, os partidos também demonstram
preocupação com o decreto baixado no mês passado, que reforçaria esses poderes
da Abin. Para as legendas, a norma é mais um dos “abusos do governo federal”,
com a intenção não de aperfeiçoar o serviço de inteligência, “mas dar mais
dados à sua linha investigativa paralela” contra possíveis adversários
político-ideológicos.
Segundo o decreto, órgãos de
inteligência devem fornecer à Abin “dados e conhecimentos específicos
relacionados à defesa das instituições e dos interesses nacionais”. Os
ministros do Supremo ponderaram que o próprio decreto explica que esse
compartilhamento deve ser feito de conformidade com a legislação vigente.
Portanto, dados sigilosos não poderiam ser fornecidos sem autorização judicial.
Os ministros Edson Fachin e Luís Roberto Barroso lembraram que, na
ditadura militar, houve uso indevido de dados de inteligência para a produção
de dossiês contra adversários. Ainda assim, ambos ressaltaram que o serviço de
inteligência é importante para a segurança nacional e formulação de políticas
públicas.
Aras: PGR nomeia ex-diretor da Abin como
'colaborador' do Conselho Nacional do Ministério Público
— O Brasil da legalidade constitucional não admite autoritarismos, não compactua com a corrupção como forma de governança, põe a cobro corruptos e corruptores, protege a ordem jurídica democrática e tem um Judiciário que não se verga a ameaças ou agressões. Com ainda mais razão, o Supremo Tribunal Federal de ontem, de hoje e de sempre tem um compromisso com esta história. Tem-se um cenário em que a ausência de protocolos claros de proteção e tratamento de dados, somada à possibilidade, narrada na inicial e amplamente divulgada na imprensa, de construção de dossiês investigativos contra servidores públicos e cidadãos pertencentes à oposição política, deve gerar preocupações quanto à limitação constitucional do serviço de inteligência — disse Fachin.
Nenhum comentário:
Postar um comentário