'Síndrome do celibato': por que os jovens do Japão não fazem mais sexo?
- Reprodução/The GuardianJaponeses hoje preferem investir na carreira a casar ou ter um relacionamento; pesquisa mostra que, no Japão, um terço das pessoas com menos de 30 anos nunca teve qualquer tipo de experiência amorosa. Taxa de natalidade em 2012 foi a menor de que se tem registro no país
Para o governo japonês, essa síndrome pode significar uma catástrofe iminente. O Japão já tem uma das menores taxas de natalidade do mundo, e a atual população de 126 milhões de pessoas --que vem diminuindo nos últimos dez anos-- pode ser reduzida em 30% até 2060, segundo projeções feitas no país.
Milhões de japoneses não estão sequer namorando, e o número de pessoas solteiras atingiu seu recorde. Uma pesquisa realizada em 2011 constatou que 61% dos homens e 49% das mulheres com idade entre 18 e 34 anos não mantinham qualquer tipo de relação romântica com outra pessoa. Outra pesquisa mostrou que um terço das pessoas com menos de 30 anos nunca havia tipo uma experiência amorosa --na vida.
Dados oficiais mostram, ainda, que o número de bebês nascidos no Japão em 2012 é o menor de que se tem registro. Além disso, com o aumento da população de idosos, as vendas de fraldas geriátricas ultrapassaram as de fraldas para bebês pela primeira vez em 2012. Para Kunio Kitamura, da Associação de Planejamento Familiar, a crise demográfica é tão grave que o Japão "pode eventualmente acabar em extinção".
Nesse cenário, surgiu, então, o profissional que trabalha como conselheiro de sexo e relacionamento, a fim de tentar curar a chamada "síndrome do celibato". Ai Aoyama, 52 --que cerca de 15 anos atrás ganhou a vida como dominatrix profisisonal-- é uma dessas conselheiras. Ela diz que, hoje, seu trabalho é muito mais desafiador.
- A ex-dominatrix Ai Aoyama, 52, conselheira de sexo e relacionamento, e um de seus clientes
Aoyama afirma que, além do sexo casual, vê o crescimento da procura por pornografia online e "namoradas virtuais". Ou então, opina, estão substituindo o sexo por outras formas de relaxamento e diversão.
A pressão para se conformar ao modelo de família anacrônico do Japão --marido assalariado que trabalha 20 horas por dia e mulher dona de casa-- permanece forte, e talvez essa seja uma das explicações para o fenômeno do celibato. Ironicamente, o sistema que produziu papéis conjugais segregados também criou o ambiente ideal para aqueles que querem ficar só, sem qualquer incômodo, como costumam falar. "As pessoas não sabem para onde ir. Elas vêm até mim porque pensam que, por querer algo diferente, há algo de errado com elas", conta Aoyama.
Família X Trabalho
Embora as mulheres japonesas sejam cada vez mais independentes e ambiciosas, no mundo corporativo japonês é quase impossível que a mulher consiga combinar carreira e família. Assim, as mulheres japonesas hoje encaram o casamento como o "túmulo" da carreiras conquistada --cerca de 70% das mulheres japonesas deixam seus empregos depois de seu primeiro filho, e o Fórum Econômico Mundial classifica o Japão como um dos piores países do mundo para a igualdade de gênero no trabalho.Eri Tomita, 32, trabalha no departamento de recursos humanos de um banco francês --e adora. Fluente no idioma francês e com dois diplomas universitários, ela evita relacionamentos românticos para poder se concentrar no trabalho. "Um namorado me pediu em casamento há três anos, e eu recusei quando percebi que se preocupava mais com o meu trabalho. Depois disso, perdi o interesse em namoro." Tomita diz ainda que às vezes tem "uma noite só" com homens que conhece em bares, mas afirma que sexo não é uma prioridade para ela.
- Eri Tomita, 32, que recusou um pedido de casamento. "Percebi que me preocupava mais com o trabalho. Perdi o interesse em namoro"
"É muito preocupante. Eu não ganho um salário enorme e não quero essa responsabilidade do casamento", diz Kishino, que se define como "um homem heterossexual para quem relacionamentos e sexo não são importantes".
Futuro
O Japão está oferecendo uma visão do futuro de todos nós?Muitas das mudanças constatadas lá vem ocorrendo em outros países avançados também: no outro lado urbano da Ásia, na Europa e na América as pessoas estão se casando mais tarde, taxas de natalidade têm caído e famílias de uma pessoa só estão em ascensão. No entanto, para o demógrafo Nicholas Eberstadt, é um conjunto de fatores que caba acelerando essa tendências no Japão: falta de autoridade religiosa que pregue o casamento e a família, o alto custo de vida e a precária geografia do país, localizado em zona com frequentes abalos sísmicos, o que gera sentimentos de inutilidade."Aos poucos, mas inexoravelmente, o Japão evolui para um tipo de sociedade cujos contornos só foram contemplados na ficção científica", escreveu Eberstadt no ano passado.
Voltando à ex-dominatrix Ai Aoyama, ela se diz determinada a educar seus clientes sobre o valor daquilo que chama de "pele a pele", "coração a coração". "Não é saudável que as pessoas sejam tão desconectados umas das outras fisicamente", diz. "Sexo com outra pessoa é uma necessidade humana que produz sensação de bem estar e ajuda as pessoas a encarar melhor a vida cotidiana."
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