Artigo publicado no "A Pauta"
Por Noelia Brito@
Tenho ouvido aqui e ali afirmações de que o povo pernambucano não é mais o mesmo de outrora. Que está entregue ao conformismo e que está tudo dominado pelo poderio político do governador Eduardo Campos.
O povo pernambucano sempre foi conhecido e sempre se orgulhou de seu espírito revolucionário, espírito dos insurretos de 1645, dos Mascates, de 1710, dos conspiradores dos Suassunas, de 1801, dos revolucionários de 1817, dos confederados do Equador, de 1824, dos revoltosos da Cabanada, de 1832, dos revolucionários praieiros, de 1848, só para citar alguns dos mais importantes movimentos libertários promovidos por pernambucanos, com destaque mais que especial para os quilombolas dos Palmares.
Por certo que um povo que tem a liberdade encravada no próprio DNA não poderia, jamais, renegar seu histórico de lutas e se entregar ao comodismo fácil, próprio dos vassalos, posição para a qual o pernambucano nunca foi vocacionado.
Parando um pouco para pensar sobre essa estranha reviravolta no espírito do povo pernambucano, de povo vocacionado para a revolução e para o inconformismo com as imposições do status quo, para a de vassalo do stablishment percebi que essa assertiva não passava de uma grande falácia, criada pelo marketing oficial, para propagar a crença de que não adianta a minoria estridente rebelar-se, pois a maioria está muito satisfeita com o que vê e vive.
Como cheguei a essa conclusão? Por meio da observação da quantidade e da diversidade de protestos e manifestação de insatisfação que têm eclodido no Estado. Embora o próprio governo, por pura conveniência, venha focando nos protestos feitos pelos estudantes e trabalhadores engajados na luta pelo “passe livre”, nos transportes coletivos, a verdade é que um número impressionante de setores da sociedade pernambucana têm se insurgido contra a falta de políticas públicas e as péssimas condições dos serviços prestados pelo Poder Público, em especial aqueles já entregues à iniciativa privada, como é o caso da saúde, que em Pernambuco foi transferida , por Eduardo Campos, às chamadas Organizações Sociais.
Ano passado, ou seja, antes mesmo da onda de protestos desencadeada no país pelos manifestantes das Frentes de Lula pelo Transporte Público e pelos movimentos em defesa do “Passe Livre”, matérias de jornais já davam conta de que Pernambuco era um dos estados onde mais se contabilizavam protestos de populares, tomando as ruas de nossas cidades.
Aliás, quando os manifestantes pelo “passe livre” gritam que “não é só por dez centavos”, eles estão, na verdade, ecoando o grito de todos os manifestantes de todos os protestos que eclodiram nos últimos anos no país, e, em especial, em Pernambuco, onde o governador, seus vassalos e seus marqueteiros insistem em tentar impor a mordaça como regra, transformando nossa terra num estado de exceção, com o perdão do trocadilho, seja por meio de sua polícia política, seja por meio do Judiciário, seja por meio de todo tipo de perseguição aos que lutam sem rendição.
Uma rápida pesquisa sobre os protestos ocorridos só do ano passado para cá, em Pernambuco e encontraremos manifestações contra a municipalização de escolas estaduais, protestos contra a interdição de postos de saúde, como o do PAM da 1º de Março, protesto dos trabalhadores de SUAPE, por melhores condições de trabalho, protesto dos alunos de uma escola em Olinda, há anos em reforma, protesto de moradores contra a violência no trânsito por falta de sinalização, passarelas, etc, protestos contra o abandono de obras públicas, inclusive de conjuntos habitacionais, num estado onde o déficit de moradias é escandaloso, protesto por transporte público de qualidade e por mais respeito aos usuários, como o ocorrido no metrô esta semana, protesto de sem teto, sem terra, sem escola, sem saúde, sem comida, ou seja, a insatisfação é generalizada e quando integrantes do governo Eduardo Campos e algumas pessoas da mídia oficial saem afirmando que a população está cansada de tantos protestos, na verdade, estão querendo mascarar o que realmente já cansou a população, em especial a que depende dos serviços públicos, que é a total incapacidade gerencial desse governo, que vende a falsa ideia de eficiência por metas e mais metas supostamente atingidas, em dar as mínimas condições de vida necessárias para que a população não precise mais protestar.
Como o governo Eduardo Campos é incapaz de atender aos anseios populares com políticas públicas eficientes, já que para isso teria que contrariar seus aliados no empresariado, a quem enche de mimos através de doações de terrenos, incentivos fiscais e Parcerias Público-Privadas onde só quem leva vantagem é a parte privada das parcerias, o jeito que encontra para coibir as manifestações populares de insatisfação é mandando a repressão policial acossar os insurretos. Quem afirmar que a repressão policial é contra atos de vandalismo ou é leviano ou se finge de cego para melhor enganar. A repressão de Eduardo Campos aos que protestam não está limitada aos estudantes e trabalhadores que lutam pela melhoria dos transportes, contra quem a publicidade oficial lançou uma campanha repugnante e difamatória, atribuindo-lhes a pecha de vândalos e desocupados. A repressão está contra todos os movimentos promovidos por todos que reclamam contra a inépcia do governo Eduardo Campos.
O que não faltam são registros e denúncias nas redes sociais, no YouTube, até nos jornais e programas de TV, da repressão brutal da polícia do governador Eduardo Campos contra manifestantes em todo e qualquer tipo de levante que possa macular, minimamente, a falsa imagem de grande gestor que ele e seus marqueteiros criaram para iludir a população. Agora que sonha com voos mais altos e que acredita poder estender sua ditadura para o resto do país, recrudesce as perseguições contra os que se atrevem a dizer que não é bem assim.
A sorte do governador Eduardo Campos é que o combativo povo pernambucano ainda não unificou em um só levante todas as suas insatisfações contra seu modo pseudomeritocrata de governar. A revolta ainda está dispersa, eclodindo ora aqui, ora ali, pontuada por insatisfações localizadas. No momento, porém, que todos os insatisfeitos se reunirem e perceberem o inimigo comum, por certo que esse governo farsante será definitivamente desmascarado. Eduardo Campos tem mesmo muito por que temer os manifestantes, os que protestam, pois sabe melhor que ninguém que não são uns poucos, mas a maioria, os que estão insatisfeitos, uma maioria que, porém, para o bem de Eduardo, ainda não unificou sua luta.
@Noelia Brito é advogada e procuradora do Município do Recife
Análise bem oportuna sobre a o comportamento do povo pernambucano diante do rumo que as manifestações tomaram. Não fui para mais, pois viajo muito e quando muitas delas ocorreram eu me encontrava no sertão do estado; além do que o "passe livre", especificamente, eu não sou de total acordo. Não sei até que ponto seria viável identificar os representantes das manifestações de diversas áreas para elaborar algo mais forte...Eu tenho me comedido em me tornar mais exposto por conta do meu trabalho, meu ativismo pela internet também está mais tímido. Mas sinto vontade de ser mais ativista. Sempre acompanho suas postagens pelo FB... Admiro por essa sua exposição. Forte abraço!
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