quarta-feira, 9 de outubro de 2019

VOLTA DA TORTURA




"Seleção de Psicopatas": "Eu vi eles pegando o cabo de uma doze e introduzindo na bunda de um rapaz; foram dois agentes...tentaram primeiro introduzir no ânus dele um cabo de enxada, mas não conseguiram". Ação assinada por 17 Procuradores da República no Pará relata terror em presídios sob gestão de Sergio Moro.


Afastado pela Justiça após MPF apontar tortura em presídios, ex-coordenador Maycon Cesar Rottava (o primeiro à direita), participa de evento com Moro (Foto: Estadão)

"Como estávamos nus, e fomos obrigados a ficar enfileirados encostados uns nos outros, os órgãos sexuais de um preso encostava no da frente, o que causou muito constrangimento; quem fez isso foram agentes federais e os GPE (estaduais); eu vi eles pegando o cabo de uma doze e introduzindo na bunda de um rapaz; foram dois agentes, ele estava em posição de procedimento, ou seja, com as mãos na cabeça; tentaram primeiro introduzir no ânus dele um cabo de enxada, mas não conseguiram, aí conseguiram com o cabo da doze; inclusive, eu vi esse rapaz saindo de ambulância e os médicos atendendo ele". Esse é apenas um dos relatos que instruem a ação de improbidade administrativa assinada por 17 Procuradores da República com atuação no Estado do Pará, pela qual foi obtido o afastamento liminar do Agente Federal de Execução Penal, MAYCON CESAR ROTTAVA, designado pela gestão Sergio Moro, para assumir o encargo de responsável pela Coordenação Institucional da Força-Tarefa de Intervenção Penitenciária - FTIP, no Estado do Pará. 

A intervenção penitenciária no Pará foi autorizada por Sergio Moro, por intermédio da Portaria nº 676/2019 (publicada em 28/01/2019), por meio do emprego da Força-Tarefa de Intervenção Penitenciária – FTIP, pelo período de 30 (trinta) dias, para exercer a coordenação dos serviços de guarda, vigilância e custódia de presos, com apoio logístico e supervisão dos órgãos de administração penitenciária e segurança pública do Estado. 

Fonte: MPF/PA
Os depoimentos colhidos pelo MPF, no Pará são assombrosos e deixam antever o aspecto doentio dos agentes que foram destacados para o serviço e de quem os escolheu. Em depoimento ao MPF, agentes penitenciários paraenses, horrorizados, chamaram a Força Tarefa de Moro de "Seleção de Psicopatas". Em outro depoimento, o preso relata abusos de natureza sexual: "ouvi de outros presos que os agentes federais acariciavam as partes íntimas de alguns presos, chegando até a meter o dedo no ânus deles; isso nunca aconteceu antes, isso não faz parte de revista, a revista que passávamos era com roupa, ou no máximo de cueca, e o policial passava a mão por cima da roupa; nessa abordagem, os agentes federais e os GPE mandam a gente esfolar o pênis, ou seja, tirar a pele da cabeça do pênis; os federais mandam também a gente virar de costa e abrir as bochechas da bunda, para ver nossos ânus; isso não ocorreu somente no primeiro dia, acontece em todas as revistas; somos revistados todas as vezes que saímos da cela, como por exemplo, quando alguém vai para enfermaria, pegar o almoço pros outros presos, por exemplo, e em todas essas oportunidades tem averiguação pelado no ânus e no pênis pelos federais; o preso que tem a mente fraca fica doido".

Esse tipo de intervenção é de responsabilidade do DEPARTAMENTO PENITENCIÁRIO NACIONAL, em apoio aos Governos de Estado, em caráter episódico e planejado, tendo em vista a situação carcerária dos Estados Federados, para situações extraordinárias de grave crise no sistema penitenciário e para treinamento e sobreaviso, de acordo com o exposto pelo próprio MPF na ação. 

A Força-Tarefa é composta por agentes federais de execução penal, agentes penitenciários estaduais e com a Coordenação Institucional que fica responsável pelo planejamento, articulação, gestão e ação. 

Na ação, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL esclarece que no exercício do controle externo da atividade policial e sistema penitenciário (7ª Câmara de Coordenação e Revisão), vem recebendo uma série de denúncias de tortura ou, no mínimo, tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes, notadamente no Centros de Recuperação Penitenciária do Pará II e III (CRPP II e CRPP III), Colônia Penal Agrícola de Santa Izabel (CPASI) e Central de Triagem Metropolitana IV (CTM IV), todos do Complexo Penitenciário de Americano, Município de Santa Izabel do Pará. 

DENÚNCIAS FORAM FEITAS POR FAMILIARES, PRESOS E POR MEMBROS DO CONSELHO PENITENCIÁRIO, PELA OAB E ATÉ POR AGENTES PENITENCIÁRIOS

De acordo com a petição do MPF, mães, companheiras de presos, presos soltos recentemente, membros do Conselho Penitenciário e membros da Ordem dos Advogados do Brasil que fiscalizam o sistema penitenciário narram uma série do que chama de "desconformidades", segundo as quais os preso vem sofrendo violência física pelos agentes federais, pois estão apanhando e sendo atingidos por balas de borracha e spray de pimenta, de modo constante, frequente e injustificado, mesmo após muitos dias da intervenção, e sem prévia indisciplina dos presos; violências morais pelos agentes federais, como ameaças, intimidações, humilhações, demonstrações excessivas de poder e controle (como ordem dos agentes federais para ficarem imóveis e em silêncio absoluto, pelo que, por impossível, apanham), de modo constante, frequente e injustificado, mesmo após muitos dias da intervenção, e sem prévia indisciplina dos presos; não estão sendo alimentados (veem comida chegando, mas não é distribuída), ou são alimentados em quantidade e qualidade aquém da mínima essencial, sem qualquer diferenciação da alimentação para diabético, hipertensos e docentes, e sofrem privação de água; não estão recebendo assistência a saúde, mesmo alguns estando feridos, com balas de borracha, ou lesionados em razão da violência física dos agentes federais – sofrem provação de medicação e tratamento, inclusive presos com deficiência, HIV e tuberculose; estão em locais sem condições mínimas de salubridade e higiene, com ratos, superlotação em nível de desmaio e sufocamento, dormindo no chão; foram privados ou recebem quantidade insuficiente de materiais de higiene pessoal, são obrigados a ficar pelados ou somente de cueca, descalços, molhados, e alguns não podendo sair do lugar sob pena de violência, sujos pelas necessidades fisiológicas; incomunicáveis, sem acesso não somente a visita de familiares, mas também de advogados, membros da Ordem dos Advogados do Brasil no exercício da fiscalização do sistema penitenciário, e de integrantes do Conselho Penitenciário.

Segundo os relatos, “Eles não se alimentam direito, eles não têm um desodorante, não têm um sabonete, não tem nada de higiene, eles fazem as necessidades deles e se lavam só com água, e vestem a mesma roupa há 30 dias; no dia em que eles foram transferidos, eles ficaram 10 horas todos nus no pátio, durante 10 horas sentados no chão, nus, algemados, algemados não, com a cabeça, com a mão na cabeça sem poder baixar, no pátio, até serem remanejado pras celas, meninas, é uma situação lamentável, que qualquer ser humano que tenha um pouco de coração se emociona, eu tô desestabilizada, eu já sou advogada vai fazer 3 anos, eu já vim muito pra presídio, sempre atuei na área penal, e nunca tinha visto na minha vida uma cena como eu vi hoje, e não é só no presídio, meninas, são em todos os presídios, tanto na Nova, quanto no CRPP III". Em outro depoimento, um detento que saiu após 3 dias de intervenção relatou que "nos 3 dias que ficou no Centro de Recuperação de Jovens e Adultos, relata que os presos ficaram sem roupa, sem comida, sentados na quadra, enfileirados, com a mão na cabela e joelho na testa, o dia inteiro, de 5 da manhã até 10 horas da noite, se eles se mexessem para tentar amenizar a dor nas costas, apanhavam, quando queriam fazer alguma necessidade fisiológica ... se o agente federal não autorizasse ir ao banheiro, faziam as necessidades no local." 


Em 26 de agosto de 2019, na sede da Procuradoria da República no Pará, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL ouviu, diretamente, sem intermediários, outro preso libertado no dia 20/08/2019, nos seguintes termos (original, sem tarjas, em anexo): “(…) os agentes federais já desceram jogando bomba para dento do bloco que estávamos e outras 2 (duas) viaturas já vieram por dentro da horta, fechando o espaço, nos encurralando;(...) botaram nós todos no campo de futebol, mandaram nós tirar as roupas, ficamos nú, das 07h30min até as 16h45min; nesse período passamos por tortura, pois estávamos no sol quente, espirravam spray na gente, quebraram muitos cabos de vassoura nas nossas costas; como estávamos nus, e fomos obrigados a ficar enfileirados encostados uns nos outros, os órgãos sexuais de um preso encostava no da frente, o que causou muito constrangimento; quem fez isso foram agentes federais e os GPE (estaduais); eu vi eles pegando o cabo de uma doze e introduzindo na bunda de um rapaz; foram dois agentes, ele estava em posição de procedimento, ou seja, com as mãos na cabeça; tentaram primeiro introduzir no ânus dele um cabo de enxada, mas não conseguiram, aí conseguiram com o cabo da doze; inclusive, eu vi esse rapaz saindo de ambulância e os médicos atendendo ele; não sei o nome dele, mas muitas pessoas viram; devido o estado que ele ficou, teve que ser recolhido da casa penal; (...) STIVE pegou uma tábua com prego, levantou a cabeça do prego, e bateu com o prego no meu pé, ou seja, ele inseriu o prego no meu pé direito; me jogaram pra dentro do bloco com o pé ferido; no dia seguinte, em vez de eu ter atendimento médico, me torturam (me deram muita porrada e spray) e jogaram de volta pra dentro do bloco novamente, sem atendimento; depois disso, cancelaram nossa alimentação por quatro dias, ou seja, ficamos sem comida da terça-feira até sexta-feira (umas 9 horas da manhã da sexta, depois da sessão de spray); (...) na nossa alimentação, vem tapuru, lavas, camisinha, luva derretida, pena de galinha, frango cru; a gente come a hora que eles querem, eles “pagam” (entregam) comida a hora que eles querem; somos ameaçados toda hora, com spray de pimenta; 

No mesmo depoimento, o preso conta: "estavam fazendo a gente se beijar, homens como homens, isso aconteceu com 6 presos; eram agentes federais que faziam isso; chamavam os presos lá na frente e faziam os presos se beijar na frente do resto; isso aconteceu no campo de futebol onde estávamos concentrados; isso foi na terça-feira, dia 13 de agosto de 2019; nunca teve esses tratamentos assim, com os estaduais não, isso começou agora com os federais".

Em 10 de setembro de 2019, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL ouviu, pessoalmente, servidores da SUSIPE que requereram anonimato, pois temem retaliações, declararam que: “trabalhamos na Central de Triagem Metropolitana II; a gente trabalha há bastante tempo, os presos não desrespeitam a gente; no CTM II nunca teve uma rebelião, nunca tivemos grandes dificuldades; lá são destinados criminosos que incidem na Maria da Penha, idoso por crime sexual, estelionatário, os presos não são violentos, são tranquilos; lá tem presos que correm riscos em outras casas penais; nós temos muitos custodiados presos pela primeira vez, muitos; não tínhamos problemas lá, pois é uma demanda muito diferenciada; lá não tem célula de crime organizado; a intervenção federal chegou lá na quarta, dia 4 de setembro, de manhã; recebemos informações do diretor da unidade de que os diaristas não deveriam trabalhar; depois foram solicitados a se apresentar lá por ordem da diretoria da administração penitenciária; no primeiro dia da intervenção federal, nós servidores fomos barrados a entrar; depois de insistência, entramos; os presos são proibidos de receber atendimento técnico; a Força-Tarefa é quem determina que não se façaatendimento técnico; havia todo um aparato de agentes federais com aquelas armas imensas; fomos apresentados ao WILLIAM, chamado de 001, e o LUCIANO, chamado de 002; eles disseram que estávamos de férias por 30 dias; começamos a escutar urros, gritos, foi um horror; momentos de terror; nunca tínhamos pensado em presenciar aquilo [choro dos declarantes], foi horrível, eram gritos; é um campo de concentração; era spray de pimenta uns 2, 3 dias; os agentes federais disseram que tinham autorização para “invadir” qualquer casa penal e “fazer qualquer coisa”; tivemos alergia com o spray de pimenta, tivemos bolhas no corpo; uma colega servidora saiu de lá com nariz sangrando; a gente sentia o spray de pimenta no ar, sendo que com os presos o spray é disparado diretamente; o espaço das celas é fechado, não tem circulação de ar, de modo que o cheiro do spray de pimenta é insuportável; os sprays de pimenta são jogados em dias seguidos, em momentos distintos, sem qualquer prévia reação dos presos ; os Agentes Federais disseram que o spray de pimenta era uma forma dos presos saírem das celas; é um negócio complemente desmedido; tiram todos os presos das celas e colocaram no solário; vimos maldade, a banalização do mal, a forma que os agentes Federais falam, com prazer daquele sofrimento; tiraram tudo deles, deixaram eles de cueca, durante 3 dias, e eles estão com 1 muda de roupa, descalços, sem toalha, as roupas deles foram jogadas fora, roupa, lençol, e o tempo todo de cabeça baixa, eles não tem autorização para falar com a gente, sempre com a mão nas cabeças; noprimeiro dia, eles sempre tinham que andar agachados; os Agentes Federais dizem que nós não podemos chamar os presos de “senhor”, mas de “vagabundo”; lá há idosos de 60 a 80 nos, há idosos sequelados de AVC; somos orientados a falar que todas as necessidades médicas estão sendo atendidas, mas desconhecemos isso; no primeiro momento, houve balas de borracha; houve disparos de balas de borracha em direção aos presos; é um espaço pequeno; em momento algum os presos reagiram, ameaçaram, não houve nenhuma hostilidade dos presos antes ou depois desses atos dos Agentes Federais; temos uma demanda enorme por atendimento psiquiátrico, antes da intervenção federal; o que eles estão fazendo é tudo o contrário de ressocialização, eles estão desconstruindo; os Agentes Federais retiraram tudo, todas as redes; lá tem capacidade para 144 presos, sendo que há atualmente há 472 presos; numa cela para 15 presos, tem 60; recebemos muitas cartas, pois é o único meio de informações com a família, sendo que o 002 proibiu as cartas; há uma arrogância extrema dos Agentes Federais; não autorizaram mais a presença de redes, e não tem espaço físico para colocar colchão; agora, no sábado, chegaram alguns colchões limpos, mas não tem espaço para colocar; eles entraram com bomba, bomba de efeito moral, sem que houvesse qualquer reação dos presos; de longe, nossas roupas ficaram manchadas com o spray de pimenta, imagine os presos lá dentro; é muito parecido com cena de holocausto, de campo de concentração, é muito degradante [choros dos depoentes]; quem está saindo de lá, está saindo de cabeça baixa, humilhado, com o psicológico todo abalado; tem familiar com cópia do alvará na mão, mas tem preso que não está sendo liberado; antes, na administração estadual, havia respeito; os Agentes Federais nos orientam, assediam, que gente tirem fotos dos familiares, narrem situações comprometedoras contra os familiares, que dispersem familiares; trabalhamos há muitos anos no sistema prisional; ouvimos gritos, urros, e tem idosos lá dentro; dizem que depois vai tranquilizar, mas não tranquiliza; tem câmeras lá, mas não funcionam, foram desativadas; o Agente Federal 002 disse que vai dar um tiro num cachorro que fica lá; tinha um idoso tossindo, e o Agente Federal disse: “para de tossir, velho, tá pensando que eu vou te dispensar?” e o Agente Federal jogou spray de pimenta no rosto dele; há 2 transsexuais lá; e 1 Agente Federal mulher, disse para o preso: “não rebola na minha frente”.


FONTE: MPF/PA
Os agentes da SUSIPE que falaram ao MPF reconhecem que antes havia tortura, mas que era pontual e que hoje é generalizada: "Antes, havia tortura? Havia sim, mas era pontual, isolado; depois da intervenção federal, é generalizado; os servidores não estão conseguindo dormir, estão tendo pesadelos; os gritos ficam na nossa cabeça; não é uma questão de apreço, não é uma questão de gostar dos presos, é uma questão de humanidade, de preservação da dignidade do ser humano, somos servidores públicos, o sistema penitenciário tem uma função a cumprir, mas isso não está acontecendo com a intervenção federal; os pertences, como roupa, sandálias, hoje são lixos, trouxas amarradas por lençóis; hoje, não pode ventilador, sendo que não tem circulação de ar, numa cela de 60 pessoas, a estrutura era de contêiner; eles ficam direto sentados, agachados; nos preocupa não só as agressões, as violações, mas o resultado de tudo isso; o que está acontecendo a sociedade tem que saber; o negócio é muito feio; são agressões generalizadas, graves, e com a conivência do poder Público, do Estado;"

SELEÇÃO DE PSICOPATAS

Para os agentes da SUSIPE, foi feita uma "seleção de psicopatas":  "parece que fizeram uma seleção de psicopatas, e deram o direito a eles se regozijarem nos presos – o que a gente vê é a banalização do mal; o 001 e o 002 sabem dessas atrocidades, pelo contrário, eles concordam com isso – é pequeno lá; o 001 é o WILLIAM, e o 002 é o LUCIANO; presenciamos muita humilhação das mulheres, a forma extremamente grosseira, e isso em espaço aberto; não vimos nenhuma resistência dos presos, não é uma resposta enérgica a uma conduta inadequada do preso; senhoras idosas presas, veem seus anéis, seus perfumes, suas coisas jogadas fora; é a destruição de sua subjetividade, da sua personalidade; que sociedade é essa que a gente está construindo; eles dizem que estão ensinando respeito, mas eles não estão ensinando respeito, estão ensinando o medo; não é uma coisa isolada; na sexta-feira anterior, houve revista, e não se constatou nada de errado; antes, havia remissão para leitura, e com a intervenção federal, eles estão proibidos de ter acesso aos livres; antes, havia autorização para 1 televisão por cela, hoje está proibido – eles vão pensar em que? Em se matar; eles não podem orar, na verdade eles não podem nem conversar; a Comissão de Direitos Humanos ficou retida lá na frente, depois foram lá no CRF; tudo isso seria evitado se alguma autoridade tivesse entrado lá; os advogados na prática não estão entrando lá; não tem justiça pra essas pessoas? Eles não são deuses; há um preconceito com a gente do Norte, nós nortistas, até pelo jeito deles olhares pra gente; nunca pensamos que íamos viver para ver isso”. 

O relato, de servidores da SUSIPE, inaugura nova fase probatória, afirma o MPF na ação, já que antes "poderia haver discurso de que as narrativas de presos e familiares seriam fantasiosas, tendenciosas ou exageradas, com o fim de terem benefício no seu estado de liberdade. Mas agora, com depoimentos de servidores da SUSIPE, que, como todos servidores públicos, possuem fé pública, o cenário fático probatório ganha maior confiabilidade e credibilidade."

Em 09 de setembro de 2019, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL ouviu familiar de preso, que por temer retaliações, requereu anonimato, e declarou: “Sou cunhada de um preso, que está no CRF, e a gente escutou muitos gritos, pedidos de socorro, escutamos elas falando: “não matam ela”; eles estavam afogando ela dentro do vaso sanitário; elas gritavam; “não matam ela dentro do vaso, tira ela”; hoje é que eles liberaram para levar 1 calcinha, 1 sutiã, 1 toalha e 1 lençol, todo branco; agora, os agentes federais falam: cala a bora; eles batem muito; elas ficaram nuas na frente de agentes masculinos e femininas; sai caminhões e caminhões cheio de coisas quebradas, como ventiladores quebrados”.

FONTE: MPF/PA
Segundo o MPF, no dia 04.09.2019 a FTIP ingressou no centro de recuperação por volta das 04h00 da manhã, soltando bombas, espirrando spray de pimenta e colocando as presas para fora das celas apenas de roupas íntimas, e que algumas presas ficaram nuas, todas na frente de agentes federais homens; Várias mulheres relatam que apanharam de cacetetes por parte de agentes federais masculinos. As presas ficaram sob procedimento, agachadas e amontoadas, com a mão na nuca, entre quatro e cinco horas; que nesse período ficaram sem beber água, que no primeiro dia teriam tido apenas uma alimentação por volta das 17h; 5. Que foram colocaram 80 presas numa única cela; que a todo momento ordenaram procedimento de agachamento, estando as presas nuas, que focaram lanternas no ânus.


Muitas mulheres em período menstrual ficaram sem receber absorventes e colocaram várias presas sentadas (nuas ou de peças íntimas) sobre um formigueiro no meio de um pavilhão. Várias relataram coceiras, corrimentos, inflamações, infecções; em nenhum caso foi relatado qualquer atendimento. Há relatos de que foram impedidas de realizarem culto religioso e que não estão recebendo as medicações que necessitam (e foram identificados casos graves de epilepsia e hipertensão não medicada).

No dia 12.09.2019, o mesmo grupo de fiscalização deslocou-se para o Centro de Recuperação Feminino, e desta vez ingressou no bloco das presas sentenciadas. Foram formadas duplas para atender as mulheres por cela, cujos relatos foram registrados em vídeos por elas autorizados, com as seguintes denúncias: "1. Que na madrugada para amanhecer o dia 04.09 os agentes da FTIP entraram no bloco soltando bombas, que foram obrigadas a retirar a roupa e ficaram nuas ou de roupas íntimas na frente dos agentes homens; 2. Que ficaram muitas horas nessa condição, no chão molhada, sendo “oprimidas e humilhadas” psicologicamente e fisicamente; 3. Que todas relataram que foram muito agredidas fisicamente com cacetetes, spray de pimenta, choque elétrico; que foram muito xingadas, chamadas de “porcas”, “sujas”; 4. Que foram retirados todos os seus pertences pessoais e desde então ficaram descalças, só com um uniforme, sem toalhas, lençóis e colchões, e sem material de higiene, o que tem causado coceiras; 5. Que ficaram por horas sem tomar água e a comida receberam apenas uma vez em alguns dias e que vinha crua e azeda, pelo que não conseguiam se alimentar; 6. Várias mulheres estavam com feridas e hematomas, cuspindo sangue; se queixam que estão apenas com uma muda de roupa, que não conseguem fazer a higiene íntima e estão com corrimentos; 7. Que muitas foram obrigadas a sentar em cima de urina e fezes de rato; 8. Algumas relataram que foram fotografadas e/ou filmadas, nuas ou em roupas íntimas, pelos agentes homens da força tarefa; 9. Identificamos várias presas idosas na área da enfermaria com situações graves de saúde, sendo que uma não consegui abrir os olhos devido ao spray de pimenta e outra com HIV não estava recebendo a medicação, sendo que ela nem mesmo consegue andar; 10. Uma presa, durante a visita, teve uma crise epilética, na presença da comitiva e foi retirada da cela pela equipe de enfermagem e levada para a ala de enfermagem; 11. Outras presas hipertensas denunciaram estar sem medicação e algumas com febre também sem atendimento e medicação; 12. Haveria uma denúncia de que uma das presas estaria grávida e devido às agressões físicas abortou, tendo sido levada para a Santa Casa em Belém"

LGBT'S SÃO VÍTIMAS DE TRATAMENTO MAIS HOSTIL

Na representação PR-PA-00041098/2019 que deu origem à Notícia de Fato 1.23.000.001726/2019-28, narra-se que: DENÚNCIA DE VIOLAÇÕES AOS DIREITOS HUMANOS POR AGENTES DA FORÇA NACIONAL NO CRF - ANANINDEUA Nesta data, compareceram as representantes para denunciar violações aos direitos humanos praticadas por tropas da Força Nacional no Centro de Reeducação Feminina - CRF de Ananindeua, onde suas filhas estão custodiadas. As representantes relatam que as detentas estão sofrendo constantes agressões, com golpes e spray de pimenta, com tratamento ainda mais hostil para as presas LGBT`S, o que é o caso das suas filhas. Dizem que às 4h do dia 04.09.2019 ingressaram agentes da Força Nacional (maioria homens) no CRF e forçaram as detentas a ficar somente com roupas íntimas e sentadas com a mão na nuca por longas horas pronunciando palavras de ordem, sem possibilidade de deitar para dormir e de sair para fazer suas necessidades fisiológicas, o que as obrigam a fazer no local em que estão sentadas. Também informam que o fornecimento de alimento está precário, vez que é fornecida somente uma marmita às 15h e as detentas são obrigadas a poupar comida caso queiram se alimentar novamente à noite, e que o fornecimento de energia elétrica do local foi interrompido. É relatado também que escutam nos arredores do CRF gritos de dor das detentas e de palavras de ordem de agentes da Força Nacional. Registram, ainda, que os bens pessoais das detentas, como lençóis, colchonetes, vestimentas, ventilador, produtos de higiene, televisão, alimentos e afins, foram retirados. Informam que houve uma reorganização que provocou superlotação nas celas com a desativação do Pavilhão Primavera I e concentração de todas as detentas no Pavilhão Primavera II, onde foram colocas de mais de 70 mulheres em celas com capacidade para 12. Por fim, consignam preocupação com a vida das custodiadas, vez que há poucas notícias de suas condições, pois visitas estão proibidas, inclusive de advogados, desde o dia 05.09.2019, o que deve durar pelo menos 30 dias, podendo haver prorrogação por mais 30, segundo informação dada pela assistente social do CRF. Por todo o exposto, solicitam intervenção do Ministério Público Federal para garantir a dignidade das detentas e o direito de visita às suas familiares."

PECHA DE DESONESTIDADE ESTÁ "COLADA" NO COORDENADOR DA FTIP

De acordo com o MPF, os fatos explanados constituem "atentado, pela FTIP, coordenada por MAYCON CESAR ROTTAVA, à incolumidade física dos presos; submissão dos presos a vexame e a constrangimento não autorizado em lei; atos lesivos da honra e do patrimônio dos presos, e do próprio Departamento Penitenciário Nacional, que vê sua imagem (honra objetiva) maculada, tudo em nítido abuso e desvio de poder."

Os fatos "evidenciam presos feridos, principalmente de balas de borracha, mas não se evidencia nenhum curativo, não há registro de nenhum tratamento especificamente a essas pessoas, mesmo sendo os fatos levados a conhecimento do coordenador da FTIP por Recomendações e Ação Civil do MPF." 

Na verdade, diz o MPF, o Coordenador da FTIP, MAYCON CESAR ROTTAVA, que trabalha em Americano, passa o dia inteiro lá, coordena a custódia de presos no CRF e CTM II, e possui poder hierárquico sobre todos ali, sabe do que ocorre na própria casa que comanda. Não é necessário notificação do MPF para que se inicie sua mora, por omissão. Reitere-se que o Mecanismo Nacional de Combate a Tortura exigiu tratamento de saúde (se exigiu, é evidencia de que não está sendo dado), e que há “Muitos com marcas e cicatrizes de disparos de balas de borracha”. Por todo o exposto, afirma, "resta evidente que a conduta do requerido demonstra afronta aos princípios que deveriam nortear sua atuação administrativa, com postura contrária ao ordenamento jurídico, em conduta flagrantemente atentatória ao princípio da legalidade, além da utilização de equipamentos não letais em desvio de finalidade."

"O agente público que faz uso de sua autoridade e de bens públicos para cometer práticas, comissivas e omissivas, manifestamente atentatórias aos direitos fundamentais de seus custodiados, mediante a utilização de meios degradantes e arbitrários de punição, omissão de socorro, maus tratos e tortura, claramente apresenta comportamento dissonante do padrão esperado de qualquer servidor público. A pecha de desonestidade é evidente diante do menosprezo aos direitos básicos daqueles que se encontram sob sua guarda. É de se destacar que, por se tratar de tema de preocupação internacional, a ofensa a direitos humanos por agente representante do Estado tende a provocar significativa repercussão na mídia nacional e internacional, de modo que suas consequências recaem, em última análise, sobre a própria imagem da administração pública e da boa gestão dos negócios do Estado."

TORTURA DE FORMA INSIDIOSA

A tortura, no presente caso, e em sua maioria, é aplicada de maneira insidiosa, destaca o MPF, como por exemplo, com restrição de comida, restrição de sono, interrupção de iluminação (escuridão), superlotação (além da infelizmente já tradicional, provocando amontoamento de pessoas), não atendimento de presos machucados ou feridos (inclusive por balas de borracha – causando continuidade de sofrimento físico), privação de materiais de higiene (o Oficial de Justiça, que atuou em mandado da MM. 3ª Vara Federal, relatou que o cheiro dos presos sem higiene é tamanho que os Agentes Federais usam máscara), proibição de ir ao banheiro (obrigando o preso a fazer suas necessidades fisiológicas em si), agressões verbais, exigência para que se fique horas em uma mesma posição, no chão, agachado e com mãos na cabeça (o que provoca dores, cãibras, e desconforto excessivo, mas não deixam lesões corporais atestáveis em laudo), tiros de balas de borracha, que nem sempre atingem os presos (o que causa desestabilização emocional), uso de spray de pimenta de modo desnecessário, desproporcional, e contínuo (o que, repita-se à exaustão, não deixam lesões corporais atestáveis em laudo)."

OFICIAL DE JUSTIÇA FEDERAL E EVANGÉLICOS FICARAM SOB A MIRA DE ARMAS E FORAM AMEAÇADOS COM TIROOS DESPARADOS POR AGENTES DA INTERVENÇÃO

Não foram apenas os presos e presas e seus familiares as vítimas das torturas e ameaças praticadas pela "seleção de psicopatas" de Sergio Moro. Um oficial de Justiça certificou à Justiça que ficou sob a mira de uma arma que lhe foi apontada por um dos agente da Força de Intervenção no Pará, sob a alegativa de que ele seria uma ameaça aos agentes. Um grupo de evangélicos que pretendiam promover evangelização no presídio foi ameaçado com tiros disparados por um agente que os intimidou para que fossem embora sob pena de os tiros finalmente os acertarem. Os relatos constam também da ação.




 
JUSTIÇA AFASTOU O COORDENADOR DA FTIP/PA

"Ante o exposto, defiro o pedido liminar e decreto o afastamento cautelar do requerido MAYCON CESAR ROTTAVA da função de Coordenador Institucional da Força-Tarefa de Intervenção Penitenciária no Estado no Pará – FTIP/PA", por fim determinou o Juiz Federal JORGE FERRAZ DE OLIVEIRA JUNIOR, da 5ª Vara Federal no Pará.

BOLSONARO E SERGIO MORO MINIMIZARAM TORTURAS

Questionados sobre as graves denúncias feitas pelo MPF, no Pará, em entrevistas, Bolsonaro chamou de "besteiras" e Sergio Moro de "mal entendido".

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