Ceará é o mais afetado em doações de órgãos no País
Com a pandemia do novo coronavírus (covid-19), encontrar possíveis doadores para a realização de transplantes tem sido um grande desafio para o Ceará. De acordo com os dados da Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO), o Estado aparece como o mais afetado no Brasil, registrando queda de 71,1% (entre 1º de março e 18 de abril de 2020, na comparação com o mesmo período de 2019), seguido por Pernambuco 58,3%, e Rio de Janeiro, com menos 40%. Diante dos dados, a quantidade de transplantes feitos caiu aproximadamente 20% em todo o território nacional.
O presidente da ABTO e chefe do Serviço de Transplante Hepático do Hospital Universitário Walter Cantídio (HUWC), Doutor Huygens Garcia, explica os principais motivos para a diminuição nos transplantes. Segundo o médico, com o isolamento social, a carência de UTIs e principalmente a impossibilidade de utilizar órgãos de doadores infectados pela covid-19 são alguns dos fatores que podem explicar a redução. “Trabalhamos com muito cuidado, antes de qualquer procedimento, solicitamos uma bateria de exames para saber se o doador está com vírus. Nossa preocupação é de tal forma, que os hospitais com alto risco de contaminação, optamos por não fazer a cirurgia neste local”, afirma Huygens.
A Associação Brasileira de Transplante relata que não recomenda a utilização dos órgãos, neste caso, por não existir uma literatura médica suficiente para apontar os riscos ao receptor. No entanto, como o resultado dos exames retarda a sair em média de 12 horas, a negação familiar tem aumentado bastante.
Cautela
Diante disso, a coordenadora da Central de Transplantes do Ceará, Eliana Barbosa, reconhece a multiplicidade de fatores para a baixa nas doações. Ela acrescenta que a queda no sinistro de trânsito também contribuiu para o índice negativo. “O isolamento social diminuiu os acidentes com Traumatismos Cranioencefálicos (TCEs), graças a Deus, mas ao mesmo tempo, fez cair o número de notificações para novos doadores”, explica.
De acordo com Huygens Garcia, independentemente das circunstâncias atuais, toda a sua equipe continua trabalhando e realizando os transplantes de fígado, mas não com a mesma rapidez, devido ao cenário vigente. “Nesta pandemia, permanecemos operando, agora, claro, realizávamos 20 cirurgias por mês, hoje em dia não passamos de cinco ou sete devido a consequência da queda de doadores”, informa.
Esperança
O empresário Ricardo Rocha, 50, descobriu que tem cirrose hepática e, há mais ou menos três anos, convive com a necessidade de receber um novo órgão, devido o seu problema ser refratário. “Realizo o tratamento para a cirrose no Hospital Walter Cantídio (HUWC) com a equipe Dr. Huygens. Tem momentos que bate o desespero, mas confio muito em Deus, e no grupo que me atende”, revela. Enquanto a situação não é resolvida, o empresário aguarda sua vez de ser o contemplado. “Tem que esperar a vontade de Deus. Os médicos falam que pode ser a qualquer dia, qualquer hora”, completa.
Centros de transplante
Com as mudanças no panorama, transplantes de rins feitos no Hospital Geral de Fortaleza (HGF) e no Hospital Walter Cantídio foram suspensos, segundo Huygens. Já no Hospital de Messejana, centro de referência em transplante de coração no Estado, não houve nenhum procedimento até o momento.
Apesar da queda nas doações, Eliana Barbosa alega que a Central de Transplantes está tentando manter as cirurgias ativas. Foi preciso ajustar o cronograma e definir critérios de priorização para os pacientes com necessidades emergenciais. “Os de córneas estão suspensos por portarias ministeriais. Já os renais, por decisão local dos dois maiores centros, o Hospital das Clínicas e o Hospital Geral de Fortaleza, também foram, com exceção das urgências. De fígado, nós estamos tendo, mas coração e pulmão não tivemos nenhum transplante no momento”, descreve.
Doutor Huygens afirma que todos os hospitais pelo mundo estão passando pela a mesma dificuldade. Diante disso, para não deixar os pacientes desassistidos, a equipe do hospital tem se organizado para contactar os recém-transplantados e os que estão na fila de espera. Os profissionais pedem que eles se mantenham em casa, já que fazem parte do grupo de risco. “Estamos tentando fazer o nosso melhor. Se cuidem, principalmente todos que estão esperando as doações de órgãos”, declara.
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