Três dias após o anúncio da sua chapa com Eduardo Campos, em longas entrevistas exclusivas para os três principais jornais nacionais (Folha, Estadão e Globo) publicadas nesta quarta-feira, Marina Silva ocupou todos os principais espaços da mídia, como se ainda fosse candidata a presidente, para explicar a inesperada aliança da sua Rede Sustentabilidade, que não conseguiu registro no TSE, com o PSB do governador de Pernambuco, quarto colocado nas pesquisas.
Marina falou de tudo, dos motivos que a levaram a optar pelo PSB para fazer um "acordo programático, não pragmático" às diferenças entre os dois partidos, mas depois de ler tudo o que ela falou aos jornais fiquei sem saber o que ela exatamente quer da vida.
No sábado, quando a chapa foi festivamente anunciada em Brasília, parecia definido que Eduardo seria o candidato a presidente e Marina sua vice. A velha mídia chegou até a comemorar. Agora, já não é bem assim.
"Nós dois somos possibilidades", disse Marina à Folha, deixando em aberto quem será cabeça de chapa na disputa pela Presidência da República. "Para nós não interessa agora ficar discutindo as posições. Nós dois somos possibilidades e sabemos disso. Que possibilidade seremos o processo irá dizer".
Que processo, que possibilidade, o que ela quer dizer com isso? Vice-líder nas pesquisas, com três vezes mais intenções de voto do que Eduardo Campos, que deu ontem apenas uma entrevista de meia hora a um programa de rádio de Salvador, Marina começou a semana no papel de protagonista, referindo-se muitas vezes a ela mesma na terceira pessoa, como Pelé fazia.
Em sua breve entrevista, Eduardo foi duro e direto: "Chegou a hora de a gente aposentar um bocado de raposas que estão enchendo a paciência do povo brasileiro. Eles precisam ir para casa para o Brasil seguir em frente".
Já Marina, em sua linguagem bastante peculiar, que a maioria das pessoas leigas e terrenas não entende, vai na contramão da batalha dos dirigentes do PSB, há meses em busca de novos aliados para aumentar o tempo de televisão de Eduardo Campos (por enquanto, pouco mais de um minuto, 12 vezes menos do que o calculado para a aliança da presidente Dilma Rousseff, candidata à reeleição, que lidera com folga todas as pesquisas até aqui). "Quem vai definir a eleição de 2014 não é o tempo de TV, não é estrutura de campanha. É a postura".
Que postura é essa, ela não explica. Reproduzo abaixo e comento algumas declarações de Marina, e peço ajuda aos leitores para entender aonde ela quer chegar com os princípios da sua anunciada "Nova Política".
"Aqueles que divergirem têm o direito de não votar, têm o direito de não concordar, isso é democracia. Eu não sou Deus e nem com Deus todo mundo concorda".
Entenderam? Pelo menos ficamos sabendo o que Marina diz que não é, embora não se saiba ainda exatamente o que é.
"Se a gente ficar discutindo candidatura, a gente vai fazer exatamente o contrário daquilo que eu queria: discutir o programa. É um outro momento político. A candidatura que já está posta, está posta. Nós estamos discutindo um programa".
Muito bem, mas que programa? Os dois só se falaram rapidamente uma vez no final de semana e até agora nenhum deles deu qualquer pista sobre que programa é esse.
"Eu não fiz isso, em hipótese alguma, por mágoa ou raiva. Fiz em legítima defesa. Em legítima defesa da democracia, de poder discutir ideias, do direito de discutir e debater propostas, o que nos estava sendo negado".
Negado por quem? Quem estava ameaçando a democracia? Que propostas ela foi impedida de discutir e por quem?
"É preciso um governo que faça uma desruptura, que não esteja preocupado com a reeleição. Sou contra a reeleição".
O que é "desruptura"? O que a reeleição tem a ver com isso? Sabe-se apenas que, no rápido acordo acertado com Eduardo, Marina arrancou dele a garantia de que, se eleito, enviará ao Congresso Nacional proposta para acabar com a reeleição.
"Só Deus e o tempo dirão se meu gesto foi para ajudar a mudar ou se foi para me vingar. Agora, para convencer os outros, a gente tem que ter o que dizer".
É exatamente este o problema: dizer o quê?
"Não vim aqui para ficar urubuzando a candidatura do Eduardo (...) Nos dispusemos a uma aliança programática e se ela for aprofundada, não apenas no discurso, mas no ponto de vista das atitudes, mostrando que o que está sendo dito é aquilo que tem chance de ser feito, prosperará a aliança fática de apoio à sua candidatura. Se não for, valeu a intenção da semente"
Aliança fática? Intenção da semente? Por favor, me ajudem a descobrir o que é isso. De outro lado, quem, afinal, a acusou de estar "urubuzando" a candidatura de Eduardo?
"O que eu sinto é que nós vamos ter que fazer primeiro um adensamento e haverá um alinhamento que nos leva a uma linha de corte, que não imagino que seja a Rede e o PSB fazendo corte, os parceiros também têm o direito de dizer: `olha, nessa nova configuração que está posta, com a chegada dessa ecochata da Matina, me dá licença que eu estou indo embora´".
Adensamento, alinhamento, linha de corte? Não entendi nada.
"A gente está começando um pequeno desvio e é preciso ter muita delicadeza para esse desvio prosperar. Porque o eixo da sustentabilidade é muito importante, mas a sustentabilidade política é a base da transformação das outras coisas".
Um pequeno desvio? Ah, bom...
"Vejo isso como uma armadilha. Porque se nós estamos falando em um esforço programático e em novos paradigmas, juntar alhos com bugalhos pensando só em tempo de televisão não tem nada a ver com a nova política. "
Pelo jeito, Marina Silva não tem a menor ideia sobre os apoios, a estratégia e a formação dos quadros do PSB nos Estados, e a jogada de mestre do final de semana pode rapidamente se transformar numa imensa dor de cabeça para os sonhos presidenciais de Eduardo Campos, bem antes do que se poderia imaginar.
(Blog do Miro)
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