Último discurso anual mostra um Obama ativo em seu ano final
Presidente americano destaca importância de cooperação bipartidária em período de eleição
Conquistas e metas para o último ano
O discurso de Obama, aplaudido diversas vezes, começou misturando conquistas — como a recuperação econômica e a criação de mais de 14 milhões de empregos — com metas para o futuro. Citou a reaproximação com Cuba e as melhorias na Colômbia. Na parte econômica, fez forte crítica a Wall Street e citou que já há 18 milhões de americanos em seu programa de saúde, conhecido como Obamacare, e afirmou que vai reduzir o custo da universidade. Voltou a defender a aprovação da Parceria Transpacífica (TPP, maior acordo comercial do mundo) e prometeu reduzir a pobreza. Defendeu, diversas vezes, uma vida com menos poluentes e o uso da tecnologia para melhorar o meio ambiente.
— A mudança climática é apenas uma das muitas questões em que nossa segurança está ligada ao resto do mundo. E é por isso que a terceira grande questão que temos de responder é como manter a América segura e forte, sem qualquer isolamento — disse.
Compromisso de derrotar jihadistas
O presidente usou boa parte de seu discurso para falar de segurança nacional e voltou a prometer acabar com o Estado Islâmico e buscar “soluções definitivas” para o Oriente Médio, que segundo ele está passando por uma transformação que está tratando de “conflitos que remontam milênios”.— Tratar o combate ao Estado Islâmico, nossa maior reclamação, como se fosse a terceira guerra mundial é fazer o jogo deles — disse Obama, falando que o grupo não é uma ameaça ao país e não representa umas das maiores religiões do mundo. — Nós apenas precisamos dizer o que eles são: assassinos e fanáticos que têm de ser erradicados, caçados e destruídos.
O presidente afirmou que deve destruir o Estado Islâmico e a al-Qaeda, mas afirmou que o trabalho não acaba aí:
— Pois mesmo sem o Estado Islâmico, a instabilidade vai continuar por décadas em muitas partes do mundo — no Oriente Médio, no Afeganistão e no Paquistão, em partes da América Central, África e Ásia. Alguns desses lugares podem se tornar refúgios seguros para novas redes terroristas; outros serão vítimas de conflito étnico, ou a fome, alimentando a próxima onda de refugiados. O mundo vai olhar para nós para ajudar a resolver estes problemas — disse.
Obama afirmou que o mundo respeita os EUA não apenas pelo arsenal militar, mas pela diversidade, abertura e respeito a todas as religiões. Citando os casos do Vietnã e do Iraque, Obama defendeu uma nova forma de atuação militar:
— Felizmente, há uma abordagem mais inteligente, uma paciente e disciplinada estratégia que usa todos os elementos de nosso poder nacional. Ele diz que a América vai agir sempre, sozinho, se necessário, para proteger nosso povo e nossos aliados; mas em questões de interesse global, vamos mobilizar o mundo para trabalhar conosco, e nos certificar de que outros países puxem seu próprio peso — disse.
Ele voltou a defender os EUA grandes e fortes:
— Pesquisas mostram nossa posição em todo o mundo é maior do que quando fui eleito para este cargo, e quando se trata de todas as questões internacionais importantes, as pessoas do mundo não olham para Pequim ou Moscou, elas nos chamam — disse, recebendo aplausos.
Em seu discurso, Obama lembrou que os Estados Unidos sempre foram formados pelas grandes mudanças. O presidente citaria “guerras e depressão, o afluxo de imigrantes, trabalhadores que lutam por um acordo justo, e movimentos para expandir direitos civis”.
— Será que vamos responder às mudanças de nosso tempo com medo, nos voltarmos para dentro como uma nação, e virando uns contra os outros como um povo? Ou será que vamos encarar o futuro com confiança em quem somos, o que defendemos, e as coisas incríveis que podemos fazer juntos?
Obama aproveitou para falar da luta política e da polarização que cresce no país. Com o Congresso dominado pelos republicanos, poucos projetos de lei de interesse do presidente têm sido aprovados e Obama tem se utilizado cada vez mais de atos executivos, o que gera polêmica.
— Uma melhor política não significa que nós temos que concordar em tudo. Este é um grande país, com diferentes regiões e atitudes e interesses. Esse é um dos nossos pontos fortes, também. Nossos fundadores distribuíram o poder entre estados e entre ramos do governo, e esperamos discutir, assim como eles fizeram, sobre o tamanho e a forma de governo, sobre o comércio e as relações externas, sobre o significado da liberdade e os imperativos de segurança. Mas a democracia exige padrões básicos de confiança entre os seus cidadãos — disse Obama.
Obama terminou dizendo que, ao sair da Casa Branca, não vai desistir de lutar por um país melhor.
— Mas posso prometer que um ano a partir de agora, quando já não ocupar este cargo, eu estarei na rua com você, como um cidadão — inspirado por essas vozes da equidade e da visão, de coragem e bom humor e gentileza que têm ajudado os EUA a ir tão longe. Vozes que nos ajudam a ver a nós mesmos não em primeiro lugar como preto ou branco, ou asiático ou latino, não como gay ou hetero, imigrantes ou nativos; não como democratas ou republicanos, mas como americanos primeiro, vinculados por um credo comum — disse, citando Martin Luther King.
A plateia especialmente convidada para o discurso de Obama dava mostras da força política que o presidente daria em suas palavras. Segundo adiantou a primeira-dama Michelle Obama em sua conta no Instagram, estavam presentes imigrantes — inclusive um saudita que atua nas Forças Armadas dos EUA — refugiados sírios, os dois jovens americanos que evitaram um ataque terrorista em um trem na França e o casal que garantiu o casamento gay na Suprema Corte, gerando a aceitação do país ao tema. Uma cadeira deveria estar vazia, simbolizando uma vítima de arma de fogo, reforçando a luta de Obama pelo controle de armas.
corrida para cumprir promessas
Este discurso reforma que Obama não será o “pato manco”, como os americanos denominam os presidentes em fim de mandato, que a cada dia perdem prestígio e poder. Suas ações podem afetar diretamente a escolha de seu sucessor e, de certa maneira, criar uma agenda forte para a campanha.
— O presidente chega ao fim de mandato com uma força muito grande e com a vontade de definir seu legado. Isso terá impacto em todo o ano político, inclusive um peso maior nas eleições. Acredito que 2016 será um grande ano para ele — afirmou Robert Watson, da Lynn University, que acredita que o presidente, ainda jovem, será tão ativo quanto Jimmy Carter ou Bill Clinton mesmo após sair do governo.
Balanço de uma era
por HENRIQUE GOMES BATISTA
OBAMACAREO presidente criou um plano de saúde pública, embora tenha ficado aquém do que propunha e ainda ter sido reduzido por decisão da Suprema Corte. Mas, aos poucos, o plano começa a dar resultados e mais americanos o estão usando.
GUANTÁNAMO
Grande calcanhar de aquiles das promessas do presidente, a prisão e base americana encravada em território cubano continua aberta e com 105 presos, a maioria por ligação com o terrorismo. O presidente insiste em fechar o local até janeiro de 2017.
IRÃ
Obama celebrou um acordo nuclear histórico com o Irã, mas ainda depende da aprovação do Congresso. A piora na situação do Oriente Médio dificulta a análise do acordo.
GUERRAS
O presidente já avisou que não vai cumprir a promessa de deixar menos de mil soldados no Afeganistão até o fim do mandato. Agora, estima-se que ficarão cerca de 5,5 mil, e caberá ao sucessor dele por fim à mais longa guerra dos EUA, iniciada em 2001.
CUBA
A reaproximação histórica dos Estados Unidos com a ilha de Fidel Castro ocorreu por decisão pessoal de Obama, que driblou o Congresso retomando relações com Cuba baseadas em atos executivos. O embargo econômico ao país caribenho, que depende de decisão dos parlamentares, continua em vigor.
CRISE ECONÔMICA
Eleito meses após o estouro da crise cujo estopim foi a falência do banco Lehman Brothers, Obama conseguiu virar a página da crise. O desemprego está na metade do valor que era quando assumiu, e o crescimento econômico do país é o maior entre as nações desenvolvidas.
MUDANÇAS CLIMÁTICAS
Nos últimos meses, o presidente abraçou com mais força a causa climática e tem dado uma guinada ao país no tema. Obama se empenhou pessoalmente por um acordo planetário em Paris, no fim do ano. Este deve ser um tema em que vai investir no seu último ano.
DESIGUALDADE
Apesar do discurso de oportunidades para todos, Obama viu a desigualdade crescer em seu governo. A crise global foi a primeira causa, mas a recente bonança não gerou os efeitos esperados.
IMIGRAÇÃO
Grande tema dos republicanos, Obama se vale de atos administrativos para favorecer a vida dos imigrantes com filhos americanos, que estejam nos EUA há anos e não tenham nenhum antecedente criminal. Mas não conseguiu reformar a lei que trata do tema.
ARMAS
A nova cruzada pelo controle de armas, também baseada em atos administrativos, visa a obter algum avanço no setor, depois de anos sem nenhum passo concreto. A tentativa de reformar o sistema prisional também avança de maneira lenta.
ESPIONAGEM
Obama enfrentou em seu governo o escândalo da Agência de Segurança nacional (NSA), que chegou a espionar líderes de outros países. O tema gerou constrangimento aos EUA, que tiveram que pedir desculpas em diversos casos.
GAYS
Apesar de seu forte discurso em favor da igualdade, o avanço mais forte para os gays ficou com a Suprema Corte, que julgou legal o casamento entre pessoas do mesmo sexo. (H. G. B.)
Do O Globo
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