quinta-feira, 2 de maio de 2019

IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA


MPF: Juíza federal tem bens bloqueados por conceder liminares indevidas a empresas de combustíveis no RJ





Arte: Secom/PGR

Em ação civil pública por ato de improbidade administrativa movida pelo Ministério Público Federal (MPF), a Justiça Federal concedeu medida cautelar para bloquear as contas e os bens da juíza federal Cláudia Valéria Mello e de outros 13 réus, acusados de participação em um esquema de concessão de liminares indevidas entre 2000 e 2003 no estado do Rio de Janeiro. As liminares beneficiavam empresas distribuidoras de combustíveis, para que, por exemplo, comercializassem o produto sem as restrições impostas pelas normas da Agência Nacional do Petróleo (ANP). O objetivo da indisponibilidade de bens é assegurar a efetividade de decisão futura que porventura venha a determinar o integral ressarcimento do dano, a perda dos bens ou valores indevidamente recebidos. (Processo n° 5004429-86.2019.4.02.5101)

A pedido do MPF, o valor total da medida de indisponibilidade de bens referentes à juíza é de R$ 495,445 milhões, enquanto dos outros réus o valor chega a mais de R$ 1,7 bilhão. Esses valores consideram o dano atualizado e acrescido de juros e multas relativas ao enriquecimento ilícito e ressarcimento do referido dano, calculado a partir das liminares concedidas pela juíza que determinavam a venda de combustíveis com redução ou supressão de tributos devidos.

Atuação da juíza federal - Nomeada para a magistratura em 1998, para o cargo de juíza substituta, Cláudia chegou, em 2001, ao cargo de juíza federal do Rio, exercendo a função jurisdicional na 23ª Vara Federal, indo depois para a Vara Federal de Angra dos Reis (06/07/2001 a 05/12/2001) e Nova Friburgo (28/12/2001 a 31/07/2003). Nessa trajetória, a magistrada, em conluio com as empresas distribuidoras de combustíveis, concedeu liminares favoráveis às pretensões das companhias, desconsiderando o fato de que algumas dessas empresas promoveram ou simularam mudança de domicílio, ao passo que outras sequer indicavam domicílio no estado do Rio de Janeiro.

O MPF apurou, ainda, a partir da análise da tramitação desses processos, a celeridade da juíza na apreciação das liminares e na intimação dos responsáveis pelo cumprimento, inclusive mediante entrega de ofício em mãos para que a ciência fosse diligenciada pelos próprios advogados interessados, o que não se reproduzia nos atos de intimação da Fazenda Nacional, dificultando a adoção célere das providências necessárias à suspensão dos efeitos de tais liminares e permitindo que empresas cujo volume de aquisição de combustíveis para revenda era até então inexpressivo passassem a competir, de uma hora para outra, com as maiores empresas do ramo em volume de comércio.

Pelo menos em 11 ações protocoladas entre 2000 e 2003 nas Varas Federais do Rio de Janeiro, Angra dos Reis e Nova Friburgo, comprovaram-se que, apesar das empresas terem sede em outros estados, foram simuladas suas transferências para os locais onde a magistrada Cláudia Valéria estava exercendo a jurisdição e, assim, obterem liminares favoráveis. Além dessas ações, o MPF identificou, ainda, a concessão indevida de liminares em ações que pretendiam obter a validade, a eficácia e o resgate de Títulos de Dívida Pública. No município de Nova Friburgo, pelo menos duas liminares referentes a títulos da dívida pública externa foram indevidamente concedidas.

Paralelamente, foram observados diversos indícios de incompatibilidade patrimonial e do recebimento de vantagens indevidas por meio de depósitos sem origem lícita comprovada e da celebração de contrato simulado com a empresa Mello’s Mel Empreendimentos Artísticos, pertencente ao marido da juíza, Allyrio Domingues de Mello Júnior. No período, o casal teve gastos equivalentes a R$ 1,648 milhão. Além desses gastos efetivamente realizados entre 2001 e 2003, o casal assumiu financiamento em 2003 no montante adicional de R$ 324 mil, o que elevaria os gastos no período para R$ 1,937 milhão, quase seis vezes o montante recebido pela juíza do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2) e de outras fontes de renda.

Procedimento disciplinar - Submetida a Procedimento Administrativo Disciplina (PAD), o TRF2 concluiu que as condutas tomadas pela magistrada configuraram faltas funcionais graves, já que desviaram das finalidades jurisdicionais apresentadas na Lei Orgânica da Magistratura, com penalidade de disponibilidade com vencimentos proporcionais. Na esfera criminal, no entanto, a magistrada foi absolvida pelo Tribunal.

“Entretanto, esse fato não impede agora o ajuizamento de ação de improbidade administrativa, haja vista a independência entre as instâncias civil, criminal e administrativa. Dessa forma, ao absolver os réus com o argumento de que não houve a prova dos fatos, não impede que os mesmos fatos sejam analisados na esfera cível, já que não haver prova da ocorrência dos fatos não significa que eles inexistiram ou que o casal não os tenha praticado”, argumentou o procurador da República Rodrigo da Costa Lines, autor da ação.

Para o MPF, não resta dúvidas de que a magistrada concedeu as liminares com o fim precípuo de receber vantagem indevida. “A improbidade administrativa resulta da violação do patamar ético mínimo ao qual está vinculado todo servidor público por força dos deveres fundamentais de honestidade e eficiência funcional mínima”, esclarece o procurador.

Além da magistrada e de seu marido, os outros réus que tiveram os bens bloqueados são: Bagiani & Pascoal Empreendimentos e Administração, Pedro Antonio Ribeiro da Silva, Elder Luis Musssi Bagiani, Hiroshi Abe Junior, Jorge Bloise, Pars Produtos de Processamento de Dados, Rita Vera Martins Costa, Giane Dias de Menezes, Jaime Fridman e Maria do Socorro Sukty Oliveira Contrucci, além de Cézar Turíbio Antunes de Oliveira e Jurandir Alievi, incluídos após a ação por termo de aditamento.

Texto: Assessoria de Comunicação Social
Procuradoria da República no Rio de Janeiro

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