Sou do tempo em que se botavam cadeiras na calçada para alguma prosa com os vizinhos e conhecidos. A conversa normalmente começava à boca-da-noite e fluía descontraidamente até dez, onze horas. Tranquilidade, calma na rua, só quebrada pelos cumprimentos do boa noite! dos conhecidos. Tratava-se de velhos costumes herdados de ancestrais, que passaram de geração a geração. Mas o tempo foi passando, o progresso chegando, a população crescendo e o provincianismo perdendo o lugar. O aumento populacional e o desenvolvimento relâmpago da tecnologia passaram a ditar novas condutas sociais e estilos de vida. Surgiu a televisão com suas novelas, por exemplo, e as cadeiras das calçadas foram sendo recolhidas e colocadas estáticas ao pé dos televisores. Todos reunidos na mesma sala, no mesmo lugar e na mesma programação, mas, todos calados, todos isolados e sem conversar. O diálogo diário acabou a vizinhança praticamente sumiu, as conversas se tornaram coisas do passado e os vizinhos quase se tornaram estranhos.
Paralelos a essas mudanças, os moradores de grandes e até das pequenas cidades passaram a viver engaiolados e ao mesmo tempo a conviver com a decadência moral da sociedade e o aviltamento dos costumes. Falso moralismo? Não, realidade. A violência, por sua vez, foi chegando sorrateira e se instalou nos centros urbanos e rurais, amedrontando e trazendo insegurança a todos. Se hoje não existem cadeiras nas calçadas, muito menos existe a tranquilidade para os que usam as ruas dia e noite. O progresso trouxe inegáveis benefícios, mas gerou a violência que assalta, que mata e assassina, a um custo bem elevado, agravado com a entrada da droga em cena.
Nesse quadro desolador e preocupante, o cidadão fica atônito sem ter a quem recorrer, sente-se impotente, o Estado não lhe dá segurança no trabalho nem garantias de vida. É um salve-se quem puder ou um cada um por si nesse corre-corre diário assustador, desembestado e incontrolável. A televisão, a internet, o telefone e o carro, produtos admiráveis da inteligência humana, da medicina e de toda essa tecnologia moderna, fazem prodígios e produzem milagres. O assassinato de Abel, o primeiro fratricídio de repercussão na História, de lá prá cá multiplicado por milhões e milhões de vezes, continua um fato real,desafiador, de tal maneira que não mais sensibiliza as pessoas, a vida foi banalizada e, ao que tudo indica, para sempre. Se vivemos com o progresso, temos então e somos forçados a conviver também com a violência e a insensibilidade que essa corrida louca nos impõe. Não temos mais tempo, sequer, de pensar, e quando isso ocorre a insensatez passa a guiar os nossos passos. O inferno, tão temido pela Igreja, pode ser aqui!
*Newton Pedrosa é jornalista e advogado
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