quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

Violência invade Nordeste

Fortaleza lidera índice de homicídios
Mais um número alarmante para a juventude cearense. O Ceará é o terceiro estado brasileiro com o maior Índice de Homicídios na Adolescência (IHA), com uma perda de 7,74 adolescentes em cada 1.000. Já Fortaleza lidera entre as capitais, com 9,92 jovens entre 12 a 18 anos assassinados a cada grupo de 1.000 indivíduos nessa faixa etária. O estudo faz parte do Programa de Redução da Violência Letal Contra Adolescentes e Jovens, realizado pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH), em parceria com a Unicef, a ONG Observatório de Favelas e o Laboratório de Análise da Violência da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (LAV-Uerj). Os dados foram divulgados ontem e estimam que, até 2019, cerca de três mil adolescentes serão vítimas de homicídios na Capital.
 Há sete anos, a capital cearense tinha taxa menor: de 2,35 adolescentes por mil. Entre 2011 e 2013, o indicador saltou de 5,71 para 9,92, resultando em número absoluto de mortes esperadas entre 2013 e 2019, superior ao de São Paulo, que tem população de adolescentes quatro vezes maior.
 Neste estudo, é calculado o IHA para todos os municípios brasileiros com mais de 100 mil habitantes em 2012, de acordo com os dados oficiais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Para o conjunto da população dos 288 municípios estudados, o IHA atingiu um valor de 3,32 adolescentes perdidos para cada grupo de mil indivíduos nesta faixa etária em 2012. O resultado cresceu em relação ao ano anterior, em que o IHA foi de 2,84.
 A partir do cálculo do IHA de 2012, é possível estimar o número de vidas adolescentes que serão perdidas até 2019, se as condições atuais forem mantidas. Aproximadamente 42 mil adolescentes serão assassinados em municípios com mais de 100 mil habitantes. No Nordeste, se nada for feito, mais de 16.000 adolescentes morrerão antes de completar 19 anos.
NORDESTE
Os três estados em que o índice foi mais elevado são da região Nordeste. Alagoas ocupa a primeira posição, com 8,82 adolescentes assassinados em cada mil. A Bahia, com 8,59 por mil, ficou com a segunda colocação, seguida pelo Ceará, com 7,74 por mil. Entre os dez estados com maiores taxas, também estão incluídos a Paraíba (5º), o Rio Grande do Norte (6º) e Pernambuco (10º). Ao contrário dos vizinhos, Piauí e Maranhão ficaram abaixo da média nacional, com IHA de 2,26 e de 2,98 adolescentes por mil habitantes de 12 anos em 2012.
 Capitais do Nordeste também ocuparam as três primeiras posições entre as que apresentam maior risco de assassinato para adolescentes. Além de Fortaleza, que encabeça a lista, vem Maceió, com 9,37, e Salvador, com 8,32 homicídios por mil adolescentes com 12 anos em 2012.
3Ps
Na análise da secretária especial dos Direitos Humanos, Ideli Salvatti, a questão da violência no Brasil é voltada para um perfil de três “p”, “pobre, preto e da periferia”. O representante da Unicef, Gary Stahl, afirmou que, a cada hora, morre um adolescente negro no País. Segundo ele, o número só fica atrás da Nigéria.
Pesquisador do Laboratório de Estudos e Pesquisas sobre Conflitualidade e Violência (Covio), da Universidade Estatual do Ceará (Uece), Geovani Facó, concorda com o perfil retratado no levantamento. “A pesquisa é muito preocupante. Ela mostra que a concentração de vítimas no quadro de violência urbana é o jovem. É quase um genocídio juvenil no Brasil. Além disso, tem o outro recorte, onde a taxa de vitimização do jovem negro é bem maior do que a do adolescente branco. As probabilidades de vitimização aumentam também quando são jovens do sexo masculino, negros e pobres. A vulnerabilidade juvenil traz como consequência a exposição do jovem à violência”, analisou o pesquisador.
 
Pesquisador aponta ausência de mediação de conflitos
 
Na estimativa do IHA, até 2019, 42 mil adolescentes serão assassinados em municípios com mais de 100 mil habitantes, caso nada seja feito para reverter o prognóstico. Apenas em Fortaleza, esse número pode chegar a três mil jovens. Para o pesquisador Geovani Jacó, a previsão é de quase um genocídio juvenil. “Vamos tirar dos jovens aquilo que nós esperávamos deles: o futuro”, observou Jacó.
 Segundo ele, os adolescentes são vitimizados, principalmente, pela violência interpessoal, marcada por conflitos entre os grupos e disputa de território. O quadro é, conforme Jacó, agravado pela ausência de mediação de conflitos. “Diria que a estética dessa violência urbana é marcada por sociabilidade violenta, fundada por conflitos e disputas. Além disso, vem a ausência de mediação dos conflitos. Aqui, entra a história das políticas públicas, das ações dos órgãos para dar segurança, sobretudo, para prevenção da ação criminosa. Isso está ausente”, comentou o pesquisador.
 Outro ponto abordado por Facó é a violência policial. De acordo com ele, no Brasil, a polícia mata muito comparada as outros países. A violência atinge justamente os jovens por estarem envolvidos em relações violentas estimuladas, especialmente, pela falta de mediação de conflitos. “O Estado e os órgãos públicos poderiam prevenir e mediar conflitos, muitas vezes de baixo potencial. Mas, pela ausência dessa mediação, os conflitos evoluem para alto potencial, resultando nesse número de homicídios. A juventude termina vítima do excesso da polícia e da ausência do Estado”.
 Para ele, o modelo de segurança pública estende-se praticamente a todo o País, pontuada pela ação militarizada para combater a violência urbana. “A polícia é preparada para a guerra, para o combate ao inimigo. Não é uma polícia que media. Ela age sozinha, não faz parte de um conjunto de ações e instituições que atuam na prevenção e mediação. E ela age numa realidade onde os atores principais são os jovens”, afirmou.
MERCADO DO CRIME
Facó destacou que, nos últimos 15 anos, a violência mudou de direção, migrando do eixo Rio de Janeiro / São Paulo para outras metrópoles. Conforme o pesquisador, Fortaleza despontou como modelo de desenvolvimento, porém, desordenado, a exemplo de outros capitais do Nordeste, que também estão na lista dos maiores IHA. “Isso muda as relações, abre para a expansão do narcotráfico e a disputa de território. O desenvolvimento sem o devido aumento de ofertas públicas de lazer, habitação, trabalho transforma cidades que antes não eram referência em violência urbana juvenil”, apontou.
 Na ausência de políticas públicas, ponderou Facó, e também na pouca oferta de emprego, escola, renda, o jovem é atraído para o mercado do crime, onde ele tem acesso a “oportunidade e instrumentos, que são as armas”. “A escola se tornou desinteressante e passou a competir com outras ofertas como o crime organizado. A grande maioria de crimes que vitimizam os jovens é praticada por armas de fogo, revelando que a população não apenas está armada, como tem acesso facilitado por um mercado de armas. Se não oferecem oportunidades, os adolescentes são atraídos para o mercado do crime. Esse desenvolvimento cria distorções que tem como consequência social a subtração do futuro do jovem, principalmente, o pobre e negro”, analisou o pesquisador.
FORTALECIMENTO DA JUVENTUDE
Para a Coordenadoria Especial de Políticas Públicas da Juventude (CEPPJ), a elevada taxa de homicídios do público jovem é um aspecto preocupante. Assim, a CEPPJ afirmou que tem como prioridade a promoção dos direitos da juventude, integrando e fortalecendo as estratégias de promoção dos direitos humanos e garantindo relações equânimes de gênero, raça/etnia, acessibilidade e diversidade sexual.
 A coordenadoria destacou que desenvolve projetos que atuam de forma preventiva e que tocam diretamente na redução desses índices. Na Rede Cuca (Barra, Mondubim e Jangurussu) existe a supervisão de mediação de conflitos a qual desenvolve ações em parceria com núcleos de mediação do Ministério Público. Os Cucas recebem jovens que cumprem medidas sócioeducativas (centros educacionais, centros de semi liberdade, prestação de trabalho nos Cucas). Além disso, desenvolvem essa metodologia em praças, associações e sedes comunitárias.

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