Subterrâneos da Justiça
As investigações sobre a venda de liminares na Justiça cearense expõe em cores talvez inéditas um escândalo percebido há muitos anos nos subterrâneos do poder e da advocacia. Já houve gente afastada – alguns voltaram e por cima mais tarde –, mas há indicações diversas de que o esquema se reinventa e se perpetua. Decisões obscuras, a maioria delas na calada dos plantões judiciários, quando é mais fácil direcionar a distribuição dos processos para os magistrados que integram os esquemas.
Suspeitas remontam a mais de uma década atrás. Num tempo em que não havia ainda Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o Judiciário foi atingido por denúncias que incluíam tráfico de influência, crimes acobertados, “indústria” de indenizações, escritório de lobby, pagamento de propinas, desvios de recursos relacionados a processos, irregularidades em concursos e muitos outros. Naquela época, desembargadores e juízes foram afastados e houve quebra de sigilo. Ex-presidente do TJ e então corregedora, Águeda Passos chegou a dizer que não poria a mão no fogo por cinco colegas. Presidente do Tribunal de Ética da OAB Ceará na época, Feliciano de Carvalho reconheceu que havia esquemas, montados por certos advogados com o conluio de gente na magistratura.
Em 2005, o então governador Lúcio Alcântara falou de “decisões absurdas”, “suspeitas”, em grande número, mas partindo de poucos magistrados. Situações em que havia “um único advogado, um único juiz, dando sempre as mesmas sentenças”.
É quilométrica a lista de sentenças completamente descabidas concedidas em plantões. O esquema, como bem salientou Feliciano, nasce de alguns advogados, que são braços do crime. Tal depuração precisa ser permanente, mas não só isso. Os sistemas de controle precisam funcionar – e estavam sendo fraudados, como mostra no O POVO de hoje a colega Hébely Rebouças. É preciso transparência e fiscalização.
Uma parte dessa fiscalização é fácil: não dá para admitir que determinado tipo de decisão seja tomado em plantão. Sobretudo a soltura de criminosos perigosos. Os plantões têm finalidade específica, muitas vezes desrespeitada.
Outra questão é de origem: o modelo de seleção de magistrados e de controle sobre sua atuação. Há problema na distribuição de processos e nas liminares emitidas nos plantões, mas há questão precedente: bandidos que estariam vendendo decisões judiciais não podem integrar os quadros da Justiça.
Cabe aos magistrados regular os conflitos da vida em coletividade, ser o guardião da lei e assegurar a efetividade da justiça em plenitude. A corrupção dos julgadores é porta de entrada para crimes, irregularidades e desrespeitos a direitos em todas as suas dimensões. É um dos pilares fundamentais da estrutura social.
O IMPERATIVO DA TRANSPARÊNCIA
Interessantes avanços em relação a esses problemas têm havido na gestão do desembargador Gerardo Brígido. O CNJ igualmente tem fechado o cerco. O momento é promissor e é muito salutar que as questões sejam tratadas com a maior transparência possível.
Entendo que o nome dos magistrados não seja exposto antes que haja comprovação dos crimes. Porém, de um lado, a omissão dos nomes deixa a nuvem pairando sobre a corte inteira. Por outro, camaradas sobre os quais pairam tais denúncias não podem continuar a decidir o destino de pessoas que buscam o Tribunal em busca de justiça. Nem mesmo enquanto as investigações estiverem em curso. (EricoFirmo - O POVO Online)
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