ATENDIMENTO
Falta de acesso a órgãos dificulta denúncias contra violências
04.08.2014
Telefones que não atendem, ramais ocupados ou órgãos sem operar 24 horas foram problemas encontrados
A reportagem do Diário do Nordeste entrou em contato com órgãos responsáveis por receber denúncias de violação de direitos humanos e constatou que a tarefa de apontar os possíveis crimes não é tão simples como deveria. Telefones que não atendem, ramais constantemente ocupados, atendimentos realizados apenas presencialmente e órgãos que não funcionam 24 horas foram as falhas encontradas em diferentes situações.
A Delegacia de Combate à Exploração da Criança e do Adolescente (Dececa), por exemplo, é a única de Fortaleza especializada neste público, mas apesar disso, não atua com atendimento 24 horas. A reportagem entrou em contato com a unidade na última quarta-feira (30) um pouco depois das 19h, para saber como proceder em caso de uma denúncia, uma vez que é no turno da noite que a rede de exploração sexual se intensifica. A pessoa que atendeu, no entanto, disse que denúncias são realizadas somente entre os horários de 7h30 e 18h e presencialmente.
Os Conselhos Tutelares são responsáveis por atuar junto a órgãos e entidades com o objetivo de zelar pelos direitos das crianças e dos adolescentes, conforme determina o artigo 136 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Na capital cearense, existem seis unidades, uma em cada Secretaria Executiva Regional (SER). Contatar uma dessas, entretanto, também não é uma tarefa muito fácil. A equipe de reportagem tentou contato com todas as unidades na noite de quarta-feira e nenhuma atendeu, apesar de haver um número de plantão para as ocorrências noturnas.
Na tarde da última quinta-feira (31), nova tentativa, agora em horário comercial, mas a dificuldade em obter alguma informação de como proceder em casos de denúncias permaneceu. Dos seis conselhos tutelares, em apenas dois, nos das Regionais I e IV, a ligação foi atendida e o procedimento explicado.
No Conselho da SER I, a pessoa que atendeu informou à reportagem que denúncias poderiam ser realizadas pelo Disque 100 ou diretamente na sede da unidade, por telefone ou via presencial.
Em um outro momento, a reportagem efetuou novo contato, sem se identificar como imprensa, e a informação passada foi de que as denúncias deveriam ser realizadas apenas pelo Disque 100 ou na unidade de forma presencial, uma vez que o Conselho não teria como fazer o registro por telefone.
Central
Entre os órgãos consultados pela reportagem, o Disque Direitos Humanos ou Disque 100 foi o único a se mostrar acessível de maneira imediata. O contato, realizado durante a noite, passou por uma central em que o atendimento foi possível em cerca de três minutos. O serviço é vinculado a Secretaria de Direitos Humanos (SDH) da Presidência da República.
Inicialmente voltado à proteção de crianças e adolescentes vítimas de violência sexual, o atendimento foi ampliado e passou a receber denúncias de violação de direitos de toda a população, especialmente grupos socialmente mais vulneráveis, como pessoas em situação de rua, idosos, população LGBT (lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais), além de pessoas com deficiência.
O assessor jurídico do Centro de Defesa da Criança e do Adolescente (Cedeca), Rafael Barreto, afirma que as falhas identificadas pela reportagem comprovam uma situação monitorada há anos pelo órgão. Segundo destaca, a disparidade do sistema apresenta os meios mais fáceis de acesso como os menos efetivos na resolução dos casos e os mais efetivos, menos acessíveis. Uma situação, segundo aponta, preocupante.
Conforme explica, uma denúncia registrada no Disque 100 leva de 20 dias a três meses para chegar a um órgão do território onde o caso foi apontado. "Apesar de ser o de mais fácil acesso, ele não é efetivo e a gente atribui isso a vários fatores, como mudanças frequentes dos telefones e fax dos órgãos, locais sem energia, mudanças de sede sem repassar a informação a Brasília, entre outras variáveis", diz.
Diligências
Sobre denúncias aos Conselhos Tutelares apenas de forma presencial, Rafael Barreto diz que a situação também já havia sido identificada e uma denúncia encaminhada ao Centro de Apoio Operacional à Infância e Juventude (Caopij) do Ministério Público do Estado do Ceará (MP-CE). "Isso foi oficializado e já estão tomando diligências para esclarecer que os mecanismos não podem restringir o meio de acesso. A lei não diz que é proibido receber denúncia por telefone", ressalta.
O assessor jurídico destaca, ainda, que Fortaleza deveria ter cerca de 26 Conselhos e não apenas seis, seguindo a recomendação do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), que diz ser necessário haver cinco conselhos para cada 100 mil habitantes.
Outro problema apontado por ele é o fato da Dececa não trabalhar com sistema de plantão nas noites e nos fins de semana. "Se você não tiver a disponibilidade de perder um dia de trabalho, não denuncia e a violência permanece sem o atendimento especializado, e ela é a única do Estado", critica.
Atendimento será ampliado próximo ano
A Prefeitura de Fortaleza, por meio da Secretaria de Cidadania e Direitos Humanos (SCDH), irá ampliar o número de conselheiros da capital cearense, no total de 30 atualmente, a partir do próximo ano. A informação foi passada pelo titular da Pasta, Karlo Kardoso, que disse ainda que, para amenizar a demanda e potencializar o atendimento nas unidades, a Secretaria disponibiliza psicólogos, advogados, assistentes sociais e ainda agentes administrativos.
Segundo ele, a ampliação deve ser feita de forma estruturada, o que leva tempo, destacando a disponibilidade do Disque Direitos Humanos (DDH) por meio do telefone 0800.285.0880, com o objetivo de receber e atender denúncias 24 horas por dia, com ligação gratuita e com atendentes treinados e acompanhados de perto.
"As denúncias são encaminhadas para nossa rede de retaguarda, como os conselhos tutelares, coordenadorias ou órgãos responsáveis, para apurar qualquer tipo de violação de direitos", diz. O secretário afirma, também, ser por esse canal o meio para denúncias de exploração sexual que acontecem no decorrer da noite, por exemplo, de maneira mais imediata.
Karlo Kardoso destaca, ainda, que a SCDH tem promovido reuniões para atender à infraestrutura dos seis conselhos tutelares. "Os Conselhos II e III foram reformados neste ano com salas climatizadas, brinquedoteca, ambiente de leitura e acolhimento, sala de reunião e estacionamento, e os demais passarão por reformas para atender à demanda da população", garante.
Cronograma
Sobre a dificuldade encontrada pela reportagem em fazer contato com os Conselhos por telefone, a presidente da Fundação da Criança e da Família Cidadã (Funci), Tânia Gurgel, afirma que, no momento, há um cronograma de obras em execução, no entanto, a SCDH tem buscado proporcionar as melhores condições de atendimento à população sem a interrupção dos serviços. "Também há que se considerar a grande demanda existente que acaba, por vezes, em ocupar as linhas telefônicas existentes".
Tânia Gurgel lembra, ainda, que cada Conselho tem a responsabilidade de atender, prioritariamente, as demandas dos bairros integrantes da Regional onde está localizado.
Por meio de nota, a assessoria de comunicação da Polícia Civil do Estado do Ceará informou que as denúncias feitas para a Dececa podem ser realizadas pelo telefone fixo da delegacia, pelo Disque 100 ou pelo número 181, disponibilizado pela Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS).
Em relação ao horário de funcionamento da unidade, a Polícia Civil afirma não existir, atualmente, uma demanda suficiente que justifique o plantão de 24 horas e que, nos fins de semana, o plantão da Dececa funciona em conjunto com o plantão da Delegacia de Defesa da Mulher, localizada no bairro Benfica.
A nota diz, ainda, que, segundo a titular da Dececa, Ivana Timbó, a preferência por denúncias realizadas pessoalmente ocorre por conta da maior facilidade em obter mais detalhes acerca do fato. "Ela lembrou ainda que a ida do cidadão pessoalmente à delegacia não implica dizer que o mesmo será identificado. Outra forma que o cidadão tem para fazer a denúncia é através do e-mail institucional da delegacia: dceca@policiacivil.Ce.Gov.Br", diz a nota.
SAIBA MAIS
CONSELHOS TUTELARES DE FORTALEZA
Conselho tutelar i
Avenida Bezerra de Menezes, 480, bairro Otávio Bonfim
Contatos: 32814096 / 89705961
Conselho tutelar ii
Rua da Paz, 302 a, bairro Mucuripe
Contatos: 34523462 / 88996677
Conselho tutelar iii
Rua Silveira Filho, 935,
Bairro João XXIII
Contatos: 31311958 / 88909943
Conselho tutelar iv
Rua Peru, 1957,
Bairro Vila Betânia
Contatos: 32924955 / 89704905
Conselho tutelar v
Avenida B, S/N - 1ª Etapa,
Bairro Conjunto Ceará
Contatos: 34522479 / 89705478
CONSELHO TUTELAR VI
Rua Boa Ventura,
Bairro Dias Macêdo
Contatos: 32955784 / 89705835
Acolhimentos
Casa de Passagem: 32214487
Casa das Meninas: 96650222
Casa dos Meninos: 96650123
Renato Bezerra
Repórter
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Mais informações
Disque 100
Dececa: (85) 3101.2044
Tele-Denúncia (SSPDS): 181
Disque Direitos Humanos: 0800.285.0880
(Diário do Nordeste Online)
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