quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

Inserção das pessoas com necessidades especiais na rede regular de ensino: um direito ainda a ser respeitado


Por Noelia Brito
No último fim de semana estive em Natal e lá conheci a presidente da APAE de Caicó, a professora aposentada, Gildete Medeiros que me falou sobre o valoroso trabalho dessa instituição como fomentadora e responsável direta pela inclusão das pessoas com deficiências na sociedade. A APAE – Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais surgiu em 1954 com a missão de promover a atenção integral às pessoas com deficiência intelectual ou múltipla. Hoje, nada menos que 2 mil municípios brasileiros contam com uma unidade da APAE.
Dentre as várias conquistas do movimento apaeano, uma das mais importantes, segundo os que fazem parte do movimento, foi a obrigatoriedade de realização do Teste do Pezinho, pelo qual se faz um exame laboratorial, chamado também de triagem neonatal, que detecta precocemente doenças metabólicas, genéticas e infecciosas, que poderão causar alterações no desenvolvimento neuropsicomotor do bebê.
Essa não é uma conquista a ser desprezada num país em que segundo o Censo do IBGE, ainda em 2000, tinha uma população de aproximadamente 24,5 milhões de pessoas com deficiência, 8,3% das quais, diagnosticadas com algum tipo de deficiência mental.
A partir dessa conversa com a professora Gildete, recordei das várias denúncias que já haviam me chegado dando conta das agruras por que passam os alunos com necessidades especiais e seus responsáveis, quando procuram a tão sonhada – e propalada – inserção na rede regular de ensino.
Não foi à toda, portanto, que o Estatuto da Criança e do Adolescente e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação previram a obrigatoriedade da inclusão das crianças com necessidades especiais no sistema regular de ensino, pois isso foi fruto de longos anos de luta daqueles que, assim como o movimento apaeano, estiveram na vanguarda das reivindicações pelo reconhecimento dos direitos das pessoas com necessidades especiais se integraram à sociedade de onde jamais deveriam ter sido alijadas.
Segundo a Declaração de Salamanca, o lugar dos alunos com necessidades especiais não é em escolas que os segreguem ainda mais, mas nas escolas regulares com orientação inclusiva, sendo este o meio mais eficaz de combater as atitudes discriminatórias, já tão arraigadas em nossa sociedade.
Para cumprir essas diretrizes, as escolas devem receber o adequado preparo, que vai desde o treinamento pedagógico apropriado para os professores e demais profissionais indispensáveis ao acompanhamentos dos alunos com necessidades especiais, até a disponibilização de equipamentos e material pedagógico adequado à inclusão desejada.
Segundo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação nº 9.394/96 a LDB as escolas regulares devem contar com os serviços de apoio especializado para atender à clientela especial, sendo a oferta de educação especial, dever constitucional do estado. Assim, não basta apenas inserir o aluno especial na escola regular, é preciso dar as condições para que ele se desenvolva e se insira no meio social em que vive.
O Decreto nº 7.611/2011 dita as diretrizes da educação especial em nosso país e sendo o regulamento da LDB e da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, aprovada pelo Decreto Legislativo nº 6.949/2009, não pode ser descumprido por Estados e Municípios, que lhe devem obediência.
Nesse sentindo, o sistema educacional deve ser inclusivo em todos os níveis, garantindo aprendizagem ao longo da vida, bem como a não exclusão do sistema sob a alegativa de deficiência, garantindo o ensino fundamental gratuito e compulsório, asseguradas adaptações razoáveis de acordo com as necessidades individuais e a oferta de apoio necessário, no âmbito do sistema educacional geral, com vistas a facilitar sua efetiva educação. A adoção de medidas de apoio individualizadas e efetivas, em ambientes que maximizem o desenvolvimento acadêmico e social, de acordo com a meta de inclusão plena e a oferta de educação especial preferencialmente na rede regular de ensino e apoio técnico e financeiro pelo Poder Público às instituições privadas sem fins lucrativos, especializadas e com atuação exclusiva em educação especial, também são diretrizes que devem nortear o ensino disponibilizado por Estados e Municípios à população especial.
Infelizmente, porém, num sistema em que até o ensino regular se mostra tão deficiente e carente em todos os sentidos, o que mais se tem notícia é do descaso das gestões locais com o cumprimento da LDB e da Convenção de Salamanca no tocante à disponibilização das ferramentas necessárias à inserção das pessoas com necessidades especiais na rede regular de ensino. Fundamental, portanto, que a sociedade civil esteja vigilante cobrando dos gestores a implementação das diretrizes traçadas pelo Decreto nº 7.611/2011, denunciando ao Ministério da Educação e ao Ministério Público, pois esses entes governamentais, além de suas obrigações legais, ainda recebem recursos federais específicos para investimento em educação especial e destes devem prestar contas.
Noelia Brito é advogada e procuradora do Município do Recife

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