Bolsonaro tem
até 4 de outubro para vetar ou sancionar lei eleitoral
Se a lei for
sancionada, valerá para as eleições municipais de 2020
Está nas mãos do presidente da República Jair Bolsonaro a decisão de
sancionar ou vetar (total ou parcialmente) o projeto que altera regras
eleitorais (Projeto de Lei 5029/19). Para valerem já nas eleições municipais de
2020, as novas regras precisam ser sancionadas até o dia 4 de outubro.
A primeira versão do projeto foi aprovada pelos deputados no início de
setembro com grande repercussão negativa. A reação fez com que o Senado
avançasse apenas na criação de um fundo eleitoral, sem valor definido, para financiar
as eleições no ano que vem. Quando o texto voltou à Câmara, os deputados
excluíram alguns pontos importantes, mas mantiveram trechos que críticos da
proposta acreditam que podem dar margem para caixa dois, lavagem de dinheiro,
além de reduzir mecanismos de controle dos recursos.
Após negociação entre os líderes partidários, os deputados retomaram à
votação de todo o texto, retirando quatro pontos. No relatório apresentado pelo
deputado Wilson Santiago (PTB-PB), foram suprimidos os seguintes trechos: o que
permite pagar advogados e contadores com o fundo partidário; o que aumenta o
prazo para a prestação de contas partidárias; um terceiro, que viabilizaria
diversos sistemas para a prestação das contas, além do Tribunal Superior
Eleitoral (TSE); e um último ponto que permitia partidos serem multados por
erros na prestação de contas apenas em caso de dolo, quando há intenção em
cometer uma fraude.
Fundo partidário
O texto aprovado garante o fundo eleitoral para financiamento de
campanha dos candidatos a prefeito e vereador nas eleições municipais de 2020.
A medida estabelece que os valores do fundo serão definidos por deputados e
senadores da Comissão Mista de Orçamento (CMO). O projeto de lei do orçamento
de 2020, enviado pelo Poder Executivo, já prevê a destinação de R$ 2,54 bilhões
para as eleições municipais.
Gastos
A medida prevê a contratação de serviços de consultoria contábil e
advocatícia, inclusive em qualquer processo judicial e administrativo de
interesse partidário ou de litígio que envolva candidatos do partido, eleitos
ou não, com a ressalva de que estejam diretamente relacionados ao processo
eleitoral.
Os recursos podem ser usados por partidos políticos para pagamento de
juros, multas, débitos eleitorais e demais sanções relacionadas à legislação
eleitoral ou partidária. As verbas também podem ser direcionados na compra ou
locação de bens móveis e imóveis, construção de sedes e realização de reformas;
e no pagamento pelo impulsionamento de conteúdos na internet, incluída a
priorização em resultados de sites de pesquisa.
Doações
As doações para campanhas eleitorais são restritas às pessoas físicas. A
lei atual estabelece que a doação seja feita por recibo assinado pelo doador,
limitado a 10% dos rendimentos brutos desse doador referente ao ano anterior.
Atualmente, é possível fazer as doações por cartão de crédito ou débito. Com a
medida aprovada, parlamentares permitiram o uso de boleto bancário e débito em
conta.
Propaganda partidária semestral
O texto aprovado pelos deputados prevê a volta da propaganda partidária
semestral e exceções aos limites de gastos de campanhas eleitorais. A obrigação
dessa veiculação em rede nacional e estadual foi extinta pela última reforma
eleitoral em virtude da criação do fundo eleitoral. Em cada emissora, somente
serão autorizadas inserções até que se alcance o limite diário de 12 minutos.
A medida estabelece que o partido com mais de 20 deputados federais
eleitos terá 20 minutos de tempo, por semestre, para inserções nas redes
nacionais e o mesmo tempo nas redes estaduais. A sigla que eleger de 10 a 19
deputados terá assegurado o tempo de 15 minutos a cada seis meses - tanto nas
redes nacionais quanto estaduais. Já os partidos que tenham eleitos até nove
deputados terão o tempo de 10 minutos assegurados (redes nacionais e estaduais
– cada).
Participação feminina
O texto traz ainda uma mudança com relação à atividade de mulheres
dentro de partidos políticos. A medida prevê que as siglas criem instituto com
personalidade jurídica própria para gerir esses recursos destinados
exclusivamente à participação feminina. Atualmente, a lei já determina que 5%
do fundo partidário seja usado na promoção da participação das mulheres na
política.
Repercussão negativa
Para a diretora de Operações da Organização Não Governamental
Transparência Brasil, Juliana Sakai, a forma acelerada de tramitação e o
próprio conteúdo do projeto de lei foram equivocados. Críticos ao texto
aprovado se mobilizam para pressionar o presidente da República a vetar trechos
da lei aprovada pelos congressistas.
“Deputados e senadores legislaram em causa própria. Eles definiram a
regra do jogo de como eles vão jogar, como vão receber os recursos e aplicá-los
e também como fiscalizar esses recursos. Houve um movimento forte para apressar
e votar em regime de urgência, sem discutir com a sociedade. Foram apenas
quatro horas de debates no plenário [da Câmara], não tramitou em nenhuma
comissão e foi direto para o Senado”, aponta a diretora.
Para Juliana Sakai, o projeto aprovado pode gerar problemas para que
Justiça Eleitoral fiscalize os recursos públicos do Fundo Partidário além de
abrir brechas para caixa dois e lavagem de dinheiro.
“Isso é muito grave. O projeto permite, por exemplo, o pagamento de
passagens para pessoas de fora do partido. Essas novas regras dificultam que a
Justiça Eleitoral analise o uso de recursos ao diminuir o controle das contas
dos partidos políticos”, explicou. “Essa proposta é um ataque à transparência,
são medidas que inviabilizam o controle social e surpreende que, em 2019, os
parlamentares tenham a coragem de propor um texto desse nível”, completou.
Na avaliação de Juliana Sakai, o trecho do projeto que prevê novas
regras para considerar um candidato inelegível é uma afronta à Lei da Ficha
Limpa. O texto estabelece parâmetros para avaliar se um candidato está elegível
para disputar as eleições. A definição caberá à Justiça Eleitoral que deve
considerar a data da posse e não a data do registro da candidatura, embora a
condição continue a ser aferida nesse momento.
“Isso está trazendo o caos para o sistema eleitoral ao viabilizar
campanhas, que talvez não sejam deferidas, com dinheiro público que será gasto
e candidatos que receberão votos e não serão eleitos”, disse.
Reação
Segundo senadores que fazem parte do grupo Muda, Senado (que tem 21
parlamentares), o texto final aprovado na Câmara "é uma absurda ofensa ao
Senado, à democracia e à sociedade, que acompanha atônita a destruição da já
combalida credibilidade da política como meio adequado para resolução de
conflitos".
O grupo considera a possibilidade de tomar medidas judiciais sobre o
assunto, de forma a "restabelecer o devido processo legislativo e
assegurar que a democracia brasileira está acima de interesses pessoais e
partidários".
A presidente da Comissão de Constituição e Justiça do Senado, Simone
Tebet (MDB-MS), classificou o texto aprovado na Câmara como um "retrocesso
inimaginável". Para a senadora, a sociedade tem que pressionar o
presidente da República a vetar o projeto.
“É um retrocesso inimaginável numa câmara que teve 60% do seu quadro
renovado. Quando a sociedade renovou a Câmara em 60%, eu imaginei que
descalabros como esse, retrocessos como esse, no que se refere à transparência,
publicidade do dinheiro público, a própria moralidade, não fosse mais acontecer
no plenário da Câmara dos Deputados”, disse. “Cabe agora uma ampla manifestação
da sociedade, um grito das ruas com pedido de veto ao senhor presidente da
República para que nós, no Senado, possamos manter esses vetos”, completou.
Defesa
Já o presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), tem feito uma
defesa veemente da medida. O parlamentar tem ressaltado a importância do
financiamento para garantir a participação de grupos diversos na política
brasileira.
“Reafirmamos o que fizemos no outro processo em relação ao fundo. Se não
tiver financiamento público, só vão financiar as campanhas quem tiver vinculado
a um empresário rico. Se não tiver o fundo, é uma escolha, vamos ter só ricos
ou ter gente ligado a políticos ricos”, afirmou Maia.
O deputado rebateu ainda a crítica de que a medida vai facilitar o caixa
dois nas eleições. Para ele, o que pode impedir essa prática é mais
fiscalização e punição.
“Não existem caminhos para facilitar o caixa dois. Os recursos eram
contabilizados nos escritórios de advocacia, não tem caixa dois, está
contabilizado, o que está contabilizado não é caixa dois. Você pode dizer que
esse encaminhamento não é melhor, mas caixa dois não é. Ter limite ou não, não
significa caixa dois. Nós precisamos é ter transparência, fiscalização firme e
punição firme”, disse.
Com informações da Agência Brasil
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