sexta-feira, 31 de julho de 2015

Nessa história quem é o animal irracional?

O que motiva alguém a caçar um animal por esporte?

Pesquisa pode nos dizer o que está por trás da lógica do dentista que matou o leão Cecil

REVISTA GALILEU
Você provavelmente já ouviu falar da morte de Cecil, um adorado leão do Zimbábue, causada por um dentista americano. Walter Palmer teria pagado US$55 mil dólares para que caçadores atraíssem Cecil para fora da área protegida do Parque Nacional de Hwange e, então, após uma caçada de 40 horas teria matado o animal. De acordo com o NY Times, Walter planejava empalhar a cabeça de Cecil e colocá-la como objeto de decoração em sua casa.
O dentista, alvo de protestos, se defendeu, afirmando que não sabia que matar o leão era ilegal. Mesmo assim, o governo do Zimbábue pediu a extradição do americano, alegando que ele deve ser julgado no país. 
O caso, que nós acompanhamos aqui na GALILEU, levantou uma reação em comum em boa parte de nossos leitores: a incredulidade. O que leva alguém a sair do seu país com o objetivo de matar uma criatura como Cecil por esporte? Mesmo que caçá-lo fosse legal (o que, ressaltamos, não é), por que alguém faria isso? Lembramos que o leão não é a primeira criatura morta por Palmer: ele é membro do Safari Club International, uma organização sem fins lucrativos que luta pelos 'direitos dos caçadores'. No site da organização, estão listadas 43 caçadas de Palmer - uma delas inclui a morte de um urso polar. Por que? O que motiva Palmer e seus colegas a gastar tanto dinheiro para matar um animal?
De acordo com a socióloga da Universidade de Windsor, Amy Fitzgerald, a resposta tem a ver com uma demonstração de poder e prestígio. Em 2003, ela e uma colega publicaram uma pesquisa no periódico Visual Studies em que analisaram 792 fotos de caçadores com suas caças publicadas em revistas de caça populares. A maior parte das fotos mostrava o domínio do caçador sobre o animal, normalmente o humano era fotografado sentado sobre os animais ou os segurando, demonstrando a dinâmica de poder envolvida na situação. E, claro, nas imagens o animal estava 'arrumado' - o sangue era limpado e as feridas eram escondidas da visão, para que o bicho parecesse vivo. Então os caçadores são retratados como heróis que dominaram os animais. 
Mas é apenas uma mostra de um poder que, na verdade, não existe na questão da caça, na forma física. Na antiguidade, leões eram capturados e soltos em uma pequena área para que reis pudessem matá-los. Mas a caça, em si, havia sido feita por outros homens que não apareciam nos registros. Da mesma forma, especialistas de Zimbábue trouxeram Cecil para fora do parque em que estava protegido e o colocaram em uma área para o abate por um homem capaz de pagar pelo serviço. Quem aparece na foto? Palmer, o homem com o dinheiro e o poder. Ou seja, a caçada continua uma forma com que homens ricos mostram a sua influência. 
O antropólogo Michael Gurven, da Universidade da Califórnia em Santa Bárbara, estuda tribos de caçadores e coletores na Amazônia e nota a gritante diferença entre o caso de Cecil e as situações em que alguém precisa matar um animal para garantir uma refeição. "Entra a questão do consumo. Estudo pessoas que matam animais porque não tem escolha, para se alimentar. E aí vem alguém e paga US$55 mil dólares pela oportunidade de se colocar em uma situação de risco e matar um leão". 
Sim, Palmer pagou para sentir a adrenalina. Mas a parte do consumo certamente falou mais alto. Cecil era um alvo relativamente fácil. Ele era acostumado a andar perto de humanos, então não teria a reação de um leão comum da savana. A adrenalina pode ter vindo do fato de ser uma caça ilegal. Como, afinal, o dentista levaria a carcaça de Cecil para casa, para colocar a sua cabeça em uma parede? Ter a cabeça lá seria um outro sinal de influência, muito além do poder da caça, mas do poder do dinherio do americano. Ele pagou para ter a foto. Provavelmente estava preparado para pagar mais para demonstrar seu poder ao pendurar a cabeça de um leão na parede. 

Caçadores muitas vezes se enganam ou se deixam enganar por pessoas que dizem que o dinheiro investido na caça é revertido para fundos de preservação da natureza. O Science of Us aponta que os caçadores vêem na caça uma forma de se integrar à natureza, uma forma de aproveitar a sua beleza. Mas críticos (e nós) vemos uma forma de ressaltar uma relação de poder por meio do consumo

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