Brasil é país que mais faz linchamentos; Rio amarga vice-campeonato nacional
Pesquisa do Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo (USP) identifica 1.179 casos de 1980 a 2006
Rio - ‘Vieram três pra me matar. Não deixaram nem eu me explicar.” Um susto e ameaça de morte, foi o que aconteceu no ano passado com o ambulante K., de 41 anos. Ele foi confundido com um assaltante no bairro Fonseca, em Niterói, e por pouco não foi linchado. Estudos mostram que o pesadelo experimentado por K. não é uma exceção.
“A tendência dos linchamentos é crescer, porque as instituições públicas não se mostram eficazes no cumprimento de suas funções”, resume o sociólogo. Em sua visão, os linchamentos são acontecimentos punitivos e de ódio.
“Os linchamentos expressam uma crise de desagregação social. São muito mais do que um ato a mais de violência. Expressam o tumultuado empenho da sociedade em ‘restabelecer’ a ordem onde foi rompida. Esses linchamentos, são claramente punitivos e, na maioria das vezes vingativos”, conclui o autor, professor catedrático da USP.
Agressores gostam de se filmar
A autora da pesquisa do Núcleo de Violência da USP, Ariadne Natal, alerta para um outro problema. De acordo com ela, o recurso da tecnologia (filmagem) nesses atos, são vistos de uma forma positiva para os agressores.
“Aqueles que filmam e compartilham destes vídeos, estão alimentando a visibilidade do ato. Esse fenômeno, que se limitaria a um contexto local, ganha uma dimensão muito maior. A exposição dos casos pode ter um papel de difundir a prática e criar um ambiente favorável a novos casos linchamentos”, disse a pesquisadora.
Ainda segundo ela, os comentários destes vídeos parabenizam os populares pela ação. Com isso, fica claro que aquele tipo de ação não é condenável, mas aceitável e até mesmo desejável.
Identidade com a vítima
O perfil de quem agride ou lincha alguém não é totalmente conhecido. Segundo a psicóloga Aline Gomes, o comportamento agressivo e a atitude de atacar, tomada por um cidadão de bem, podem ter relação com a identificação da pessoa com o agredido.
“O que faz essa pessoa que nunca se envolveu em uma briga agir assim são os valores que a regem. No momento em que algum ato fere a moral deste cidadão de bem, ele passa a querer justiça”, resume.
Normalmente a identificação com a vítima aflora o sentimento. Essa pessoa passa a ter um comportamento agressivo porque se põe no lugar da vítima. Nesse momento, sua parte racional fica apagada e somente a parte emocional ‘comanda’. “Ela então toma atitudes irracionais”, comenta a psicóloga.
OAB condena barbárie e separa justiça de justiçamento
“As iniciativas de linchamentos são abomináveis, pois somente agravam e estimulam a violência, não sendo solução nem para o desejo de justiça e nem de segurança”, resume o vice-presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB-RJ, Aderson Bussinger.
Quando um grupo resolve espancar pessoas que considera criminosos, é sinal de barbárie, de retrocesso social, segundo o representante da OAB. “Além de um crime não justificar outro, nada assegura que as pessoas linchadas sejam realmente culpadas, pois não passaram por um processo de apuração e julgamento”.
Bussinger insiste que os linchamentos merecem repúdio. “Aquele que lincha supostos criminosos hoje, poderá ser o linchado de amanhã”. conclui o vice-presidente. “A vontade de justiça deve ser canalizada para cobrar soluções do Estado para os graves problemas de segurança que vivemos”.
Reportagem do estagiário Vinícius Amparo
Uma pesquisa do Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo (USP), que estudou casos de linchamento de 1980 até 2006, constatou que o Brasil é o país que mais lincha no mundo. Nesse período, foram 1179 casos. O Estado do Rio de Janeiro aparece em segundo lugar com 204 justiçamentos. Em primeiro vem São Paulo, com 568.
No Rio, o linchamento mais recente ocorreu no domingo passado na Rocinha. Newton Costa Silva, de 54, anos. Newton foi encontrado morto e amarrado em um poste na Estrada da Gávea, depois de agredir com uma barra de ferro um bebê, uma menina e a mãe deles.
Mortos assim são estudados há quatro décadas pelo sociólogo José de Souza Martins, professor da USP que acaba de lançar mais um livro sobre o tema ‘Linchamentos - A Justiça Popular no Brasil’. Sua última pesquisa traz dados aterrorizantes. Ele analisou 60 anos de justiçamentos e concluiu que mais de um milhão de brasileiros já participaram de tentativas de linchamento no país.
No estudo, 2.579 pessoas foram alcançadas por linchamentos consumados e tentativas de linchamentos. Apenas 1.150 (44,6%) foram salvas. Outras 1.221 (47,3%) foram capturadas pela população e agredidas — feridas ou mortas.“A tendência dos linchamentos é crescer, porque as instituições públicas não se mostram eficazes no cumprimento de suas funções”, resume o sociólogo. Em sua visão, os linchamentos são acontecimentos punitivos e de ódio.
“Os linchamentos expressam uma crise de desagregação social. São muito mais do que um ato a mais de violência. Expressam o tumultuado empenho da sociedade em ‘restabelecer’ a ordem onde foi rompida. Esses linchamentos, são claramente punitivos e, na maioria das vezes vingativos”, conclui o autor, professor catedrático da USP.
Agressores gostam de se filmar
A autora da pesquisa do Núcleo de Violência da USP, Ariadne Natal, alerta para um outro problema. De acordo com ela, o recurso da tecnologia (filmagem) nesses atos, são vistos de uma forma positiva para os agressores.
“Aqueles que filmam e compartilham destes vídeos, estão alimentando a visibilidade do ato. Esse fenômeno, que se limitaria a um contexto local, ganha uma dimensão muito maior. A exposição dos casos pode ter um papel de difundir a prática e criar um ambiente favorável a novos casos linchamentos”, disse a pesquisadora.
Ainda segundo ela, os comentários destes vídeos parabenizam os populares pela ação. Com isso, fica claro que aquele tipo de ação não é condenável, mas aceitável e até mesmo desejável.
Identidade com a vítima
O perfil de quem agride ou lincha alguém não é totalmente conhecido. Segundo a psicóloga Aline Gomes, o comportamento agressivo e a atitude de atacar, tomada por um cidadão de bem, podem ter relação com a identificação da pessoa com o agredido.
“O que faz essa pessoa que nunca se envolveu em uma briga agir assim são os valores que a regem. No momento em que algum ato fere a moral deste cidadão de bem, ele passa a querer justiça”, resume.
Normalmente a identificação com a vítima aflora o sentimento. Essa pessoa passa a ter um comportamento agressivo porque se põe no lugar da vítima. Nesse momento, sua parte racional fica apagada e somente a parte emocional ‘comanda’. “Ela então toma atitudes irracionais”, comenta a psicóloga.
OAB condena barbárie e separa justiça de justiçamento
“As iniciativas de linchamentos são abomináveis, pois somente agravam e estimulam a violência, não sendo solução nem para o desejo de justiça e nem de segurança”, resume o vice-presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB-RJ, Aderson Bussinger.
Quando um grupo resolve espancar pessoas que considera criminosos, é sinal de barbárie, de retrocesso social, segundo o representante da OAB. “Além de um crime não justificar outro, nada assegura que as pessoas linchadas sejam realmente culpadas, pois não passaram por um processo de apuração e julgamento”.
Bussinger insiste que os linchamentos merecem repúdio. “Aquele que lincha supostos criminosos hoje, poderá ser o linchado de amanhã”. conclui o vice-presidente. “A vontade de justiça deve ser canalizada para cobrar soluções do Estado para os graves problemas de segurança que vivemos”.
Reportagem do estagiário Vinícius Amparo
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