Por Noelia Brito*
As prisões ocorridas ontem no Sul do País, que incluíram os secretários de Meio Ambiente do Estado do Rio Grande do Sul e do Município de Porto Alegre, tanto do atual governo estadual, do petista Tarso Genro, quanto do passado, da tucana Yeda Crusius, incluiu também servidores públicos responsáveis pela concessão de licenciamentos ambientais, consultores que, na verdade, nada mais são que lobistas do esquema e vários empresários da construção civil, deixam-nos extremamente apreensivos quanto à forma como vem sendo conduzida a política ambiental e urbanística, em nosso país, pois o que se percebe é que o problema não é pontual, localizado, mas já representa uma verdadeira epidemia.
Operação anterior da Polícia Federal já desbaratara um esquema de licenciamentos ilegais concedidos por servidores públicos, em Santa Catarina, beneficiando construtoras, na paradisíaca Praia de Jurerê Internacional.
Em São Paulo, somente em uma única semana do mês de março deste ano, três servidores da prefeitura da Capital foram presos exigindo propinas para regularizar imóveis, por meio de investigações promovidas pela própria Controladoria Geral do Município que apurando as denúncias recebidas, investigou a evolução patrimonial dos servidores e acionou a Polícia. Lá não se prevarica. Tanto é verdade que foi por ação da Controladoria do Município de São Paulo que um dos maiores esquemas de corrupção envolvendo licenciamentos ilegais de que se tem notícias no país foi desbaratado. Falo do chamado Esquema Aref ou Máfia dos Alvarás, pelo qual o ex-Diretor da Departamento de Aprovação de Alvarás da Prefeitura de São Paulo foi desmascarado, após a Controladoria do Município receber uma carta anônima relatando que nenhuma obra era licenciada na Capital, sem que antes fosse paga propina para Husseim Aref Saad e sua quadrilha de assessores que acumularam patrimônio superior a R$ 50 milhões, tudo já bloqueado pela Justiça, a pedido do Ministério Público de São Paulo, sempre muito atuante.
No Recife, embora as construções em áreas “non aedificandi” estejam aí, para todos verem e as construções com licenças questionáveis ou mesmo sem qualquer licença, também sejam feitas a olhos vistos, não se tem, ainda, notícias de que a Administração tenha instaurado procedimentos para investigar situações assemelhadas àquelas encontradas nas demais cidades do país, muito embora, apenas para citar um exemplo já público e notório como o das Torres da Moura Dubeux, em Casa Forte, no Parecer nº 027/2011, do Núcleo de Urbanismo e Meio Ambiente, da Secretaria de Assuntos Jurídicos da Prefeitura do Recife, haja expressa manifestação da Procuradoria, no sentido de que fosse apurada e declarada a nulidade de processos administrativos e projetos arquitetônicos por considerá-los totalmente ilegais e que, posteriormente foram, inclusive, alvo de Ação Civil Pública do Ministério Público de Pernambuco, no mesmo sentido.
O que nos causa espécie é que apesar de a Procuradoria do Município, por seu Núcleo de Urbanismo e Meio Ambiente, que é formado por procuradores concursados, especialistas, competentes, segundo a legislação que rege as competências dos órgãos municipais, afirmar categoricamente que determinado projeto, qual seja, o referido pelo Processo nº 07.43703.3.10, que trata do remembramento de lote situado parte (40%) em ZEIS (Zona de Especial Interesse Público) e parte na ARU (Área de Reestruturação Urbana), para construção de um edifício residencial de luxo, com trinta e nove andares, é totalmente ilegal, em parecer datado de 02 de dezembro de 2011, por meio de uma cotinha de uma página e meia, datada de 18 de setembro de 2012, com o singelo argumento de que “não é razoável, após a aprovação pelas instâncias técnicas, entender pelo indeferimento do remembramento”, a ex-secretária de Assuntos Jurídicos, Virgínia Pimentel, do governo João da Costa, hoje na Prefeitura de Ipojuca, mandou dar prosseguimento ao empreendimento da Moura Dubeux.
O mínimo que se deveria fazer era apurar as razões que levaram os “órgãos técnicos” àquelas decisões e autorizações ilegais que foram apontadas pela Procuradoria, por intermédio do Núcleo especializado e nunca, jamais, legitimar a ilegalidade, como se esses órgãos ou os seus ocupantes de oportunidade estivessem acima ou melhor seria dizer, à margem da lei e não a serviço desta. Se a Administração entende que não há o que apurar, espero que o Ministério Público pense diferente.
Em artigo publicado na semana passada, já advertimos que pelo menos dois empreendimentos de impacto estão na mira e já são alvo de investigações da Polícia Federal, em Pernambuco, o Novo Recife, em razão de suspeitas de irregularidades no leilão para a aquisição do imóvel onde serão construídas as Torres e a Ilha do Zeca, por suspeitas de grilagem.
Esses são apenas alguns exemplos, quiçá, a ponta de um iceberg de lama, oculto no caos de nossa cidade. Uma metrópole desordenada, de rios poluídos, de ZEIS invadidas pela especulação imobiliárias e de mangues devastados e tomados de assalto pela grilagem urbana e travestida de pós-modernidade.
*Noelia Brito é advogada e procuradora do Município do Recife
Nenhum comentário:
Postar um comentário