terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

Negros e pobres já nascem em perigo


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Por Noelia Brito*
Poucas horas após a Folha de São Paulo revelar a renúncia coletiva de todos os representantes da sociedade civil no Conselho Estadual de Direitos Humanos de Pernambuco, em protesto contra o corte de 61% das verbas previstas para que o colegiado desenvolvesse suas atividades durante todo o ano de 2014, o governador candidato, Eduardo Campos, voltou atrás e resolveu deixar o dito pelo não dito. Quem quer ser presidente do país e ainda na qualidade de porta-voz de uma Nova Política, não pode levar esse tipo de flagrante da mídia nacional, que bem demonstra o descaso do candidato com os direitos humanos.
Aliás, não foi outro o motivo que levou à demissão do até bem pouco tempo todo-poderoso secretário de Defesa Social, Wilson Damásio, que por vezes até era escalado como porta-voz do governador Eduardo Campos, tal a importância estratégica do chamado Pacto pela Vida, o programa de redução de índices de criminalidade de Pernambuco, no marketing do presidenciável. Para quem não se lembra, o ex-secretário ganhou fama nacional ao justificar, numa entrevista à repórter Fabiana Moraes, do Jornal do Commercio, estupros cometidos por policiais militares sob seu comando, como sendo resultado da “atração irresistível” das vítimas pela farda dos estupradores.
Mas os problemas de Eduardo Campos com os Direitos Humanos não param por aí. Já não é novidade que Pernambuco foi denunciado, em seu governo, a organismos internacionais de defesa dos Direitos Humanos, em razão das péssimas condições da FUNASE (que a propaganda do candidato Eduardo Campos tem chamado de FEBEM), onde menores são decapitados em rebeliões e do presídio Aníbal Bruno, considerado o pior da América Latina, pior até que o presídio de Pedrinhas, no Maranhão.
Mas o descaso do governador Eduardo com os Direitos Humanos, também se volta contra vítimas e testemunhas ameaçadas, senão vejamos a quantas anda o PPCAAM, Programa de Proteção a Crianças e Adolescentes Ameaçados de Morte.
O PPCAAM é um programa federal criado em 2003 e posto em execução a partir de 2007, em parceria com os governos estaduais e organizações não governamentais. Tem por finalidade a redução das mortalidade infanto-juvenil, mediante a proteção de crianças e adolescentes ameaçados de morte, dando especial ênfase à proteção integral e à convivência familiar.
Cabe ao Poder Judiciário, ao Ministério Público e aos Conselhos Tutelares identificar as situações de ameaça e incluir as vítimas no PPCAAM.
O perfil das pessoas que buscam a proteção do Programa , segundo dados da Secretaria Nacional de Direitos Humanos da Presidência da República não deixa dúvidas quanto a sua importância social. São pessoas do sexo masculino (76%), da raça negra (75%), faixa etária entre 15-17anos (59%), ensino fundamental incompleto (95%), moradores da capital (63%), tem a genitora como principal referência familiar (75%), renda familiar é de até 1 SM (57%) e, na maioria dos casos, a ameaça se deve ao envolvimento com o tráfico (60%).
O Programa funciona mediante o atendimento direito aos ameaçados e suas famílias, com sua retirada dos locais da ameaça e posterior inserção em novos espaços, onde novas oportunidades de trabalho e estudos, inclusive profissionalizantes, lhes possam ser oferecidas. Outra forma de atuação do programa é por meio de intervenções junto a adolescentes em situação de risco, sensibilizando a sociedade e criando políticas preventivas.
Para nosso espanto, tomamos conhecimento de que apesar da importância desse programa para a preservação das vidas de jovens e crianças ameaçados, desde novembro do ano passado, o PPCAAM está paralisado em razão da não renovação do convênio entre o governo do Estado de Pernambuco, a União Federal e a ONG Tortura Nunca Mais, que é a gestora do programa no Estado. Trâmites burocráticos estariam empacando a renovação. Mas que trâmites burocráticos seriam esses, que não se vê empenho em resolver, enquanto crianças e adolescentes correm risco de vida? Falta o quê? Uma assinatura, talvez? Convênio tem prazo de validade, de modo que não se admite que antes de seu vencimento não se tomem todas as medidas necessárias a sua renovação, em se tratando de um programa que tem por finalidade preservar vidas e vidas humanas.
Ainda segundo a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, os homicídios já correspondem a 45% das mortes entre crianças e adolescentes, sendo que entre os negros, a probabilidade é ainda 2,6 vezes maior de serem assassinados na adolescência ou na infância.
Uma matéria recente da Revista Congresso em Foco revelou que existem no país mais de 2 mil pessoas juradas de morte por testemunhar e denunciar violações de direitos humanos ou por, simplesmente, exercer seu dever funcional em todo o Brasil. Esse, na verdade, é apenas o número daquelas pessoas que já se encontram sob algum programa de proteção, pois o número de ameaçados é, sem dúvidas, muito maior.
A propaganda nazifascista que tem se espalhado pelas redes, seja de TV, sejam Sociais, segundo a qual as pessoas de bem estão com medo e não suportam mais tanta violência, como forma de justificar a ação criminosa de bandidos que, fazendo uso das próprias razões, torturaram e humilharam um adolescente pobre e negro, ao despi-lo e prendê-lo como que acorrentado em um poste, numa espécie de pelourinho moderno, quer nos levar a crer que pobres e negros são perigosos, quando a simples e fria leitura de dados estatísticos nos comprovam algo bem diferente. Perigoso mesmo, no Brasil, é ser pobre e negro, pois já aí o indivíduo se torna alvo preferencial das alarmantes estatísticas acima mencionadas.
Um governo que trata com desprezo um programa como o PPCAAM, que tem como público preferencial, como as próprias estatísticas demonstram, os pobres e os negros, diz muito sobre si mesmo e sobre a Nova Política que pretende propagar pelo resto do país.
*Noelia Brito é advogada e procuradora do Município

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