domingo, 30 de junho de 2013

A necessidade de se rotular o movimento


DO DIARIO DE PERNAMBUCOProtestos que vêm ocorrendo nas últimas semanas foram denominados por alguns como "coxinha"

Silvia Bessa
silviabessa.pe@dabr.com.br


Discussões na internet
tentam caracterizar as
manifestações que
saíram às ruas do país (GLADYSTON RODRIGUES/EM/D.A PRESS)
Discussões na internet tentam caracterizar as manifestações que saíram às ruas do país
Dizem que um neologismo surge para suprir uma necessidade vocabular. Na falta de um rótulo para definir os recentes protestos e seus participantes, ao modo caras-pintadas da era Collor, um neologismo ganhou força no campo fértil da internet e anda solto nas ruas. Tem sido comum se ouvir a palavra “coxinha”, quase sempre acompanhada por uma carga negativa. “Só tinha coxinhas”, resumiram uns; “foi um movimento ‘coxinha’”, sintetizaram outros, ao se referirem aos movimentos que em duas semanas conseguiram abalar governos, o Congresso Nacional e provocaram a aprovação de projetos históricos para o Brasil, a exemplo do que tornou a corrupção um crime hediondo. 

No Google, popular site de buscas da web, são mais de 7.720 citações à expressão “a revolução dos coxinhas”; e 5.080 à “revolta dos coxinhas”. Na rede de relacionamentos Facebook, as menções são recorrentes. Compartilha-se até artigos com teorias críticas a aquilo que seria a “revolta dos coxinhas”, para citar texto do site do grupo Passa a Palavra, que diz ter orientação anticapitalista, independente de partidos e de poderes políticos. De forma generalista, “um coxinha” seria um jovem de classe média que foi pela primeira vez a um protesto e que, supostamente, não debate, tem pouco ou nenhum envolvimento com política e partidos.

No Recife, os internautas Romero Maia, Noélia Brito, Jaqueline Couto, Júnior Soares, Márcia de Oliveira foram alguns dos que se referiram a alguma variação da palavra “coxinha” ao longo da semana, para criticar o seu uso ou para contextualizar protestos. “A esquerda ‘politizada’ está perdendo o bom senso com essa febre de rotular cidadãos que estão ao lado na rua, mas pensam diferente (‘coxinha’, ‘burguês’, ‘alienado’, ‘'integralista’, ‘zumbis’ etc.) (…)”, publicou em sua página no Facebook, Roberto Maia, analista de projetos. 

A advogada e procuradora do Recife Noélia Brito, simpatizante do PSTU, foi uma das que se referiu ao termo mais de uma vez nas redes. “O termo ‘coxinha’ já existia anteriormente às manifestações e era utilizado para apontar aquelas pessoas de classe média, politicamente corretas, sem porém se aprofundarem sobre as causas e consequências das grandes questões em debate. Nesse sentido, podemos dizer que o protesto que ocorreu no Recife, no ultimo dia 26 de junho, foi um protesto ‘coxinha’”, afirmou Noélia, quando perguntada como definiria a expressão. Para ela, não há preconceito nela, mas uma brincadeira por parte daqueles que sempre estiveram presentes nas lutas e observaram “algum nível de arrogância por parte dos neófitos presentes às manifestações e que acreditaram estar fazendo a revolução”. Sobre o protesto na capital, a procuradora cita conquistas e pontua: “É preciso que agora todos nós, sejamos ‘coxinhas’ ou não, continuemos saindo às ruas para que também avanços aconteçam”.

Segundo afirma a doutora em sociologia e jornalista Carolina Leão, que tem estudos na área de sociologia da cultura e estereótipos, o conceito “coxinha” teria surgido da cultura pop. No caso desse momento político, define alguém que estaria na manifestação em busca da festa, do espetáculo. 

“Tenho ouvido muito a palavra nos últimos dias e acredito que é o resultado da orfandade dos antigos movimentos sociais, muitos ligados à antiga esquerda, acostumada a outro tipo de plataforma de luta e outros modelos de protestos”, disse Carolina. “Eu, particularmente, não gosto porque reduz um movimento, estigmatiza e estereotipa. Como vem sendo usada muitas vezes por intelectuais ligados à esquerda, é como se quem fosse da direita não tivesse o direito de se manifestar”, arrematou.

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