Da Agência Senado
Por Gorette Brandão,
A Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) deve votar, nesta quarta-feira (12), proposta que introduz na legislação brasileira o conceito de organização criminosa, além de estipular os meios de obtenção de prova e procedimentos para a investigação desse tipo de conduta. O texto em exame é o substitutivo da Câmara dos Deputados ao Projeto de Lei do Senado (PLS) 150/2006, da ex-senadora Serys Slhessarenko, devolvido ao Senado em dezembro passado.
O texto examinado pelos deputados foi também um substitutivo ao projeto original de Serys, sugerido pelo relator da matéria, o hoje ministro da Educação Aloizio Mercadante, em sua tramitação inicial na CCJ do Senado. O objetivo da proposta é adaptar a legislação nacional aos termos da Convenção de Palermo, aprovada em assembléia da Organização das Nações Unidas (ONU) em novembro de 2000.
Quatro anos depois a convenção foi aprovada pelo Congresso Nacional e, a seguir, promulgada por decreto presidencial. Adiante, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu a eficácia de suas normas no país. Mesmo assim, sua aplicação ainda vem gerando controvérsias, como ocorreu no julgamento da Ação Penal 470, a do Mensalão. Para alguns juristas, a edição de normas sobre crimes e penas sempre depende de elaboração e aprovação prévia do Poder Legislativo.
O relator da matéria na CCJ, senador Eduardo Braga (PMDB-AM), destaca na análise do substitutivo o ponto de vista de que a ratificação da convenção gerou um compromisso ainda pendente, a ser resolvido agora: a adequação da legislação nacional a seus termos “sob pena de responsabilização do Estado brasileiro no plano internacional”.
Atuação estruturada
Pelo substitutivo, será considerada organização criminosa a associação “estruturada” de quatro ou mais pessoas com o objetivo de obter vantagem de qualquer natureza por meio da prática de infrações penais graves cujas penas sejam superiores a quatro anos ou aquelas de caráter transnacional. Uma organização estruturada possui níveis hierárquicos bem definidos e distribuição de funções.
A pena sugerida para quem integrar a organização é de três a oito anos de reclusão (início sempre em regime fechado) e multa. Também estará sujeito a essa pena quem promover, constituir ou financiar o grupo. A punição será aplicada sem eliminar as penalidades específicas pelos crimes cometidos, como assaltos, sequestros ou qualquer outro delito.
O substitutivo prevê ainda hipóteses agravantes, como o aumento no equivalente à metade da pena se houver emprego de arma de fogo e aumento de 1/6 a 2/3 se houver participação de criança ou adolescente, servidor público ou conexão com outras organizações.
O texto enviado pelo Senado previa a associação de apenas três pessoas para caracterizar uma organização criminosa. Portanto, os deputados ampliaram o número para quatro. A Câmara também ajustou a pena, que antes era de quatro a dez anos de reclusão, além de substituir a expressão “prática de crimes”, contida na redação, para “prática de infrações penais”.
Para o relator, as alterações sugeridas pelos deputados foram necessárias a fim de ampliar o alcance da legislação. A seu ver, a nova “roupagem” do conceito foi criteriosa e acertada. Quanto ao ajuste da pena, ele considerou que foi também adequada, já que o delito se caracteriza como um “crime-meio” destinado à prática de outros e será punível com ou sem a consumação dos demais.
Consenso
O relator observou que muitas vezes se perde a oportunidade de renovar a legislação penal devido ao desencontro de opiniões entre as instituições que integram o sistema de Justiça Criminal. Para ele, porém, no caso houve amplo debate na Câmara, com total convergência entre as partes ouvidas - Magistratura, Ministério Público e Defensoria Pública, além da Polícia Federal e a Civil, mais o Ministério da Justiça.
Assim, diante do “meritório consenso”, Braga preferiu manter integralmente o texto do substitutivo, sugerindo apenas uma emenda de redação para evitar qualquer tipo de "abuso" quanto ao acesso a dados dos investigados protegidos por sigilo mantidos em bases da Justiça Eleitoral, empresas telefônicas, instituições financeiras, administradoras de cartões e provedores de internet.
Para deixar mais claro o alcance da proteção, ele sugeriu incluir na redação do artigo 15 os termos “apenas” e “exclusivamente”. Assim, fica assegurado que delegados e Ministério Público terão acesso, independente de autorização judicial, “apenas” aos dados cadastrais que informem “exclusivamente” a qualificação pessoal, a filiação e endereço, como já previsto em lei aprovada no ano passado (Lei 12.683) para tornar mais eficiente o combate à lavagem de dinheiro. Já extratos bancários e de contas telefônicas, por exemplo, sempre dependerão de autorização judicial.
Ainda pelo texto, poderá ser punida a recusa ou omissão no envio de informações cadastrais à autoridade. A Câmara ajustou a pena para reclusão, de seis meses a dois anos, além de retirar da redação do tipo o termo “retardar”, buscando evitar o risco de punição por mero atraso no envio.
Tramitação
A matéria ficou três anos em exame na Câmara e, após seu retorno ao Senado, foi despachada para a CCJ. Essa será a única comissão de exame do substitutivo. Depois da votação, o texto seguirá ao Plenário, para decisão final. Se aprovada, irá a sanção.
Nessa fase de revisão, o Senado já não poderá sugerir novas mudanças de conteúdo ao texto, só restando aceitar ou rejeitar as modificações sugeridas pela Câmara.
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