terça-feira, 18 de junho de 2013

Dia 20 de junho, sejamos os andarilhos da primavera recifense



Por Noelia Brito, especial para o Blog de Jamildo

Em sua última entrevista, o grande educador Paulo Freire, autor de Pedagogia do Oprimido, revela que morreria feliz se testemunhasse um “Brasil cheio em seu tempo histórico de marchas. Marcha dos que não têm escola, marcha dos reprovados, marchas dos que querem amar e não podem, marcha dos que recusam a uma obediência servil, marcha dos que se rebelam, marcha dos que querem ser e estão proibidos de ser". À época, Freire via-se fortemente inspirado pelas marchas promovidas pelo Movimento dos Trabalhadores sem Terra, por quem não escondia uma profunda admiração, por marcharem, conforme dizia o próprio Paulo Freire, “contra uma vontade reacionária histórica”.

O que naquele momento parecia um sonho, uma quase utopia de Paulo Freire, na verdade, hoje se apresenta como vaticínio de um visionário como poucos, que conseguiu antever a realidade do povo que as maquiagens e máscaras do marketing oficial não puderam mais ocultar.

Com sua maneira eloquente e, por vezes, até poética de se expressar, Paulo Freire definiu as marchas como “andarilhagens históricas pelo mundo” e, de fato, todos nós que hoje saímos às ruas para tornar o sonho de Paulo Freire realidade, estamos fazendo parte dessa história e construindo de maneira proativa nossos destinos, para grande surpresa, aliás, do stablishment e de seus analistas e marqueteiros da arrogância que, mesmo pagos a peso de ouro, não foram capazes de prever a convulsão popular que hoje toma conta do país, pela simples razão de que não vivem a realidade das ruas, mas a nababesca opulência dos palácios e da Corte.

Mesmo sem saber, os milhares que estamos nas ruas, atendemos ao apelo de Paulo Freire, que nessa sua última e marcante entrevista, previu também uma “marcha pela decência” e “pela superação da sem-vergonhice que se democratizou terrivelmente nesse pais” pela mãos da política corrupta e corruptora. E nossas marchas são muito isso, são também um basta a toda essa descarada situação de despudor que grassa a olhos vistos e que se espalha feito metástase cancerosa nas entranhas de nossas instituições.

Mesmo diante de uma polícia extremamente violenta, o povo não se intimida e engrossa, a cada novo manifesto, o coro dos descontentes. E por que a polícia é tão violenta? E por que ainda há vozes entre nós que ecoam querendo remar contra a maré democrática que nos arrasta, irreversível? Para isso também a resposta vem das impressionantes lições de Paulo Freire. É que ainda nos falta o básico. É que ainda nos falta educação. É que nos falta aquele diferencial que ilumina e liberta. É que como disse o maior educador que esse país já conheceu, “quando a educação não é libertadora, o sonho do oprimido é ser opressor”. Pois que as marchas nos conduzam à libertação de toda opressão e que nenhum oprimido sonhe mais em ser opressor, pois essa é a real, a verdadeira razão de ser de nossa caminhada por esse mundão de meu Deus. Dia 20, sigamos juntos, então, irmanados, saindo da Praça do Derby, para fazer história, como disse Paulo Freire, os andarilhos da “primavera” recifense.

Noelia Brito é advogada e Procuradora do Recife

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